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Escolas, postos de saúde e de assistência social de Salvador viram alvo de bandidos

Escolas, postos de saúde e de assistência social de Salvador viram alvo de bandidos

"Minha mãe, que faz consultas de rotina aqui, já deu de cara com as portas fechadas mais de uma vez por conta dos roubos", conta a designer de unhas Vanessa Conceição, 33 anos, em frente a Unidade de Saúde da Família (USF) da Avenida San Martin. O local, só em 2022, já teve o serviço temporariamente suspenso duas vezes por conta da violência. Lá, em janeiro deste ano aconteceu um arrombamento e, em março, um assalto a mão armada. E o problema não está restrito a essa unidade de saúde. Episódios de violência prejudicaram o atendimento em pelo menos outros 58 prestadores de serviços públicos da cidade, de acordo com levantamento da Prefeitura Municipal de Salvador (PMS).

Este ano, 13 postos de saúde foram alvo ou cenário de crimes na capital (veja a lista abaixo) e precisaram parar de funcionar por pelo menos um dia. Na área de educação não foi diferente. De janeiro para cá, 40 escolas precisaram interromper as aulas para a recuperação de infraestrutura após bandidos invadirem as unidades. Os equipamentos de assistência social não ficam fora da mira de criminosos: seis Centros de Referência e Assistência Social (CRAS) já fecharam por furtos ou assaltos em 2022.

As paralisações em diversos serviços são resultado de um problema mais amplo, explica Sandro Cabral, professor de estratégia no setor público no Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa e na Universidade Federal da Bahia (Ufba); além de autor de diversos trabalhos na área de segurança pública.

"Segurança é um problema multifacetado. A sensação de insegurança é o pior que pode acontecer. Sem segurança, ninguém vai à rua, comércio não vende, educação é prejudicada e saúde também. Esse problema afeta diversas esferas da economia e, sobretudo, as pessoas em vulnerabilidade social que mais precisam desses serviços", afirma Cabral.

Quem paga o preço?

Os CRAS de Valéria, Lagoa da Paixão, São Cristóvão, Cajazeiras, Parque São Bartolomeu e Castelo Branco foram os seis que fecharam por conta de violência nas comunidades onde estão instalados. O CRAS de Castelo Branco foi alvo de assalto no dia 29 de abril, quando bandidos levaram celulares dos funcionários que estavam no local. Os centros da Liberdade, de São Bartolomeu, Itapuã e Fazenda Grande do Retiro também passaram por assaltos em 2021.

Ivonildo da Silva, 31, está desempregado e tem no CRAS de Castelo Branco um porto seguro para a assistência econômica - através do pedido de auxílio -, psicológica e social. Ele revela ter medo que a unidade pare de funcionar de vez após o roubo em abril: "Se o CRAS para de funcionar por roubo ou furto prejudica a gente que precisa do serviço e acaba não encontrando", desabafa.

Diretora de proteção social básica da Secretaria de Promoção Social de Salvador (Sempre), Emanuele Rodovalho afirma que os constantes ataques aos equipamentos, seja por roubo ou furto, são obstáculos para o pleno funcionamento do serviço. "Desde o ano passado, vários CRAS foram assaltados. Quando acontece, a gente precisa interromper o serviço para prestar apoio à equipe. São paradas momentâneas, que nunca chegaram a mais de um dia, mas atrapalham a população que precisa".

Ela ressalta que o programa concede serviços e benefícios para pessoas e famílias em situação de vulnerabilidade social.

A USF de San Martin também oferece diversos serviços. Por lá, além de clínico geral e dentista, existem outras especialidades a serviço da população. Vanessa [do começo da reportagem], porém, diz que o lugar precisa de segurança para não ser alvo de criminosos. "Demos graças a Deus quando essa unidade veio para cá. Minha mãe vai na clínica geral, no dentista e pega encaminhamentos para exames. Porém, de nada vai adiantar ter isso sem poder abrir por causa de roubo. A gente precisa de melhora aqui porque é muito exposto e a fuga dos bandidos é fácil", afirma.

Bruno Carianha, coordenador administrativo do Sindicato dos Servidores da Prefeitura de Salvador (Sindseps), enfatiza que o cenário é preocupante e diz que o sindicato tem demandas para tentar frear a onda de violência nos serviços. "Nossa demanda é ter agentes da Guarda Municipal nas unidades de trabalho da prefeitura como um todo, desde unidades de saúde, CRAS, CREAS, Centro Pop até Conselho Tutelar. Para todos ambientes que são objeto desse tipo de comportamento social de furtos, roubos e violência contra os trabalhadores", enumera Carianha, que pede investimento na GCM e em vídeo monitoramento.

Procurada, a Prefeitura de Salvador afirmou que trabalha para ampliar a segurança de servidores e usuários dos serviços de saúde da capital, está intensificando a implantação de um sistema de câmeras para vídeo monitoramento das unidades. "No momento, 66 unidades básicas já dispõem do sistema de monitoramento 24 horas. Com isso, os órgãos de segurança pública terão acesso às imagens nos postos, fato que possibilita uma resposta ágil aos possíveis episódios de violência que forem registrados. A ideia da gestão é ampliar gradativamente a instalação das câmeras nos postos de saúde para atingir 100% das unidades da rede beneficiada com o vídeo monitoramento", informa.

A prefeitura destacou também que, com o aumento do efetivo anunciado este mês pelo prefeito Bruno Reis, a Guarda Civil Municipal (GCM) deverá intensificar as rondas nas imediações dos postos e unidades de saúde municipais, no sentido de contribuir para o aumento da segurança nas localidades.

Escolas

As escolas também têm parado sistematicamente por conta da insegurança. Segundo a Diretoria de Infraestrutura Escolar da Secretaria Municipal de Educação e Cultura (Smed), o prejuízo financeiro e educacional provocado pelas ocorrências envolvendo segurança pública também são enormes. Por conta das ocorrências, a Smed sistematicamente precisa fazer a recuperação do sistema elétrico, já que os cabos são os principais alvos dos furtos. Além disso, é preciso trocar janelas, portas, quadros e cobertura por conta de atos de vandalismo. Já foram gastos, ainda segundo a diretoria, R$ 1,2 milhão com a recuperação das escolas. As obras também provocam, geralmente, a suspensão de aulas pelo período de uma semana até um mês, a depender do prejuízo.

A interrupção das aulas pesa no bolso dos contribuintes, mas também é um problema para o aprendizado das crianças. Além das suspensões por arrombamentos, as escolas fecharam por conta de episódios de violência nos bairros. Em maio, dois colégios pararam as aulas após confronto entre facções em Valéria. Antes disso, escolas de Cajazeiras e Águas Claras também suspenderam as aulas, afetando milhares de alunos. Entre esses estudantes estão os netos da técnica de enfermagem Solange Andrade, 53, que mora em Valéria.

Ela já perdeu as contas de quantas vezes os pequenos deixaram de ir para a aula por conta da violência. "Acontece toda vez durante a guerra [entre as facções] que eles fazem aqui. Os professores ficam inseguros, os pais não mandam as crianças para a aula com medo de algo no caminho e os meus netos acabam ficando sem aula".

Procurado para comentar o impacto da situação no setor educacional, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB) não respondeu até a publicação desta reportagem.

Resposta da SSP

A Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP-BA) também foi procurada para responder sobre o cenário de medo que tem interrompido e prejudicado os serviços públicos em Salvador. Por meio de nota, o órgão informou que não foi acionada elas secretarias municipais por conta das ocorrências.

"A Secretaria da Segurança Pública informa que em nenhum momento foi procurada por órgãos municipais para relatar qualquer tipo de problema recorrente. Lembra que nas operações em Águas Claras e Valéria, instituições de ensino e de saúde privadas e públicas, exceto algumas municipais, funcionaram normalmente", diz o texto enviado pela assessoria.

Ainda de acordo com a nota da SSP-BA, os números relativos à violência na cidade estão em declínio. "Em Salvador, de janeiro a maio de 2022, os homicídios estão com redução de 15,2%, os feminicídios com queda de 50% e os roubos em ônibus com diminuição de 34,5%", apontou a pasta

Veja os equipamentos afetados pela violência em 2022:

POSTOS DE SAÚDE

USF San Martin III – Assalto a mão armada dentro do posto
Distrito Sanitário Itapuã - Assalto a mão armada dentro do posto
CAPS São Caetano - Assalto a mão armada na entrada do posto
SAE São Francisco – servidora assaltada na entrada da unidade
USF San Martin III - Arrombamento da unidade
Distrito Centro Histórico – Arrombado várias vezes
USF PERNAMBUEZINHO – Furto
SEDE do Distrito Sanitário Cabula/Beiru - Tentativa de arrombamento
USF Resgate - Furto de computador, cpu, teclado, mouse e ar condicionado
USF Vila Fraternidade – Posto é fechado mais cedo por conta da insegurança da localidade
USF Fazenda Coutos I – Posto é fechado mais cedo por conta da insegurança da localidade
USF Estrada da Cosisa – Tentativa de arrombamento
USF Ato de Coutos I – Tentativa de arrombamento

ESCOLAS

E.M PERIPERI
E.M MOURÃO DE SÁ
CPP PERIPERI
E.M DE PARIPE

E.M CIDADE DE JEQUIÉ
CMEI SÃO GONÇALO
CMEI AMARALINA
E.M PROFESSOR CARLOS ONOFRE
E.M JOSE CALAZANS

E.M JOIR BRASILEIRO
E.M SANTA ANGELA DAS MERCÊS
E.M PERMINIO LEITE
CMEI IACY VAZ
CMEI YÊDA BARRADAS

E.M LUIZA MAHIM
E.M JORGE AMADO
CMEI UNIÃO BOCA DO RIO
E.M RAYMUNDO LEMOS
CPP BAIRRO DA PAZ
CPP SÃO CRISTÓVÃO

E.M ALEXANDRINA SANTOS PITA
E.M ROBERTO CORREIA
E.M PROFESSORA ALITA RIBEIRO

CMEI TEREZA HELENA MATA PIRES
COMPLEXO AUSTRICLIANO
E.M CONEGO EMILIO LOBO
CMEI SEMENTE DO AMANHÃ

E.M EDUARDO CAMPOS
E.M SÔNIA CAVALCANTE
CPP NOVA BRASÍLIA
CPP CANABRAVA

E.M OLGA BENÁRIO
E.M ADROALDO RIBEIRO
E.M ANTÔNIO EUZÉBIO
E.M EUGENIA ANNA DOS SANTOS
CPP SUSSUARANA
E.M DE ENGAMADEIRA

E.M MANOEL FLORENCIO
CMEI SANTA MÔNICA
E.M JULIETA VIANA

CRAS

- CRAS Valéria;
- CRAS Lagoa da Paixão;
- CRAS São Cristóvão;
- CRAS Cajazeiras;
- CRAS Castelo Branco;
- CRAS Parque São Bartolomeu