Imprimir esta página
'Não fiz por coragem, fiz por medo', diz Eva Luana sobre denúncia contra padrasto

'Não fiz por coragem, fiz por medo', diz Eva Luana sobre denúncia contra padrasto

No programa Encontro com Fátima Bernardes, desta segunda (25), da Rede Globo, Fátima recebeu Eva Luana, a jovem de 21 anos que comoveu o país inteiro ao usar as suas redes sociais para denunciar o seu padrasto por violência física e psicológica contra ela, a sua mãe e a irmã. Foram oito anos sendo humilhada, perseguida e violentada. O homem foi preso no dia 13 de fevereiro e, segundo a Polícia Civil, nega as acusações.

Fátima quis saber de onde a moradora de Camaçari, na região metropolitana de Salvador, tirou forças para fazer o relato que viralizou nas redes sociais na ultima terça, 19.

"Infelizmente, não posso dizer que eu tive força para denunciar. Eu não fiz por coragem, fiz por medo, porque já estava em um nível tão extremo, estava me sentindo tão ameaçada e perseguida que eu falei: 'Se acontecer alguma coisa comigo, a minha mãe e a minha irmã precisam estar seguras... Se for para morrer de qualquer jeito, que eu morra lutando, então eu decidi contar", relatou Eva.

"É muito difícil você passar por isso e fingir para todo mundo. As pessoas não compreendiam, me achavam estranha. Às vezes, até metida. Não estava mais aguentando a pressão das pessoas por eu ser diferente e também por eu não poder fazer nada. Eu me sentia uma fraca por ver tudo aquilo acontecendo e sem conseguir lutar. A força veio da fraqueza", ressaltou.

Perseguição
"Eu passei em outras faculdades, inclusive uma estadual e outra fora do país, em Coimbra, Portugal. Ele não permitiu que eu fosse. Um ano antes de entrar na faculdade, ele começou a fazer o mesmo curso que eu, então, até lá, onde eu poderia me sentir segura, ele estava."

"Ele invadia a sala, pegava meu celular sem eu estar esperando. Eu tinha sempre que sair antes da aula acabar e chegar muito atrasada."
Abusos começaram com a mãe
"Ele já era muito agressivo com ela. Para mim, ele era um padrasto ruim, não demonstrava nada. Ele era muito grosso e minha mãe sempre tentando mudar essa situação. Com ela, começou muito antes de mim. Era muito pesado. Eu vi a minha mãe, praticamente, quase morrer na minha frente muitas vezes. Então, quando ele me tratava daquele jeito, eu não queria sair de perto dela."

Aos 13 anos, Eva denunciou o padrasto pela primeira vez
"Essa política de cuidado com a Mulher, de Casas Abrigo e Proteção, depois da denúncia, não aconteceu. Quando denunciamos, não tínhamos mais para onde ir. Recebemos a medida protetiva e ele, que estava solto, porque não é preso imediatamente, conseguiu ter acesso a gente. Falou, pessoalmente, muitas ameaças e, como já tínhamos muito medo, a única coisa que pensamos foi: 'A gente tem que ir de novo à delegacia'. Eu até tentei, só que não consegui. Ele passou todo o roteiro para retirar a denúncia. Eu lembro de ter estudado muito cada palavra. E eu falei aquilo esperando que as pessoas notassem que não, eu não estava retirando, isso não aconteceu, isso foi porque ele teve acesso a gente."

"A gente buscou ajuda, mas, todas as casas que fomos, ele invadiu até armado, colocando em risco a vida das outras famílias, então não tinha mais para onde ir."

Namorado encorajou Eva a denunciar
Eva falou sobre a coragem e confiança que tem em seu namorado Mateus Casais. A estudante de Direito relembrou como eles se conheceram e ressaltou a importância de Mateus na hora de fazer a denúncia.

"Nós estagiamos no Fórum, ele também estuda Direito. E a gente é da mesma fé religiosa e conversávamos sobre várias coisas. Eu me sentia segura para falar com ele, porque ele era a única pessoa que não ficava me julgando. Eu me sentia segura perto dele e ele demonstrava muito carinho e afeto. Inclusive, ele tinha tentado se aproximar, só que todas as pessoas homens que se aproximavam, eu colocava uma muralha com medo. Todas as tentativas de Mateus se aproximar foram frustradas e eu fiquei muito mal com isso porque eu também comecei a gostar dele."

"Ultimamente, as coisas estavam sem controle e sem limite e chegou um momento em que eu estava pensando em suicídio e a única pessoa que que eu posso contar agora é o Mateus, e eu fui contando situações pequenas."

"Ele não me pressionou em nenhum momento. Só que ele começou a ficar muito assustado, porque eu sempre faltava, chegava atrasada, assustada, então, quando ele ficou sabendo, todos os sumiços era caso de morte. Até que ele buscou ajuda do juiz Waldir Viana, que foi um anjo na minha vida. Me senti totalmente acolhida... Eles me deram as mãos e fomos para a delegacia."

Ao lado da namorada, Mateus lembrou o momento em que Eva revelou os abusos a ele:

"Foi terrível, porque, antes dela me contar, eu já tinha desconfiado... Eu tive que largar o celular. Doía, sabe? Cada relato machucava em mim. Ela me contou por áudio e me matou ouvir ela chorando. Doía tanto que eu tinha que largar o celular para respirar. Eu estava tremendo, nervoso, nunca fiquei em choque daquela forma."
Cerca de dois mil relatos de abuso
Após o relato nas redes sociais, Eva já recebeu cerca de duas mil mensagens de outras mulheres que sofrem algum tipo de abuso:

"Mais ou menos duas mil mensagens. E elas não são de passado, é o que elas estão vivendo agora. E elas estão pedindo ajuda e força e tentando descobrir como conseguir fazer isso, porque as pessoas tem mania de achar, no português claro: 'apanha porque gosta', como se a violência física fizesse a gente sair correndo, mas a violência psicológica tira todas as suas forças."

"Quem dera que ele só batesse, mas ele ficava horas e horas, dias e dias fazendo pressão psicológica o tempo inteiro. Eu estava trabalhando em um fórum com advogados, juízes e polícias e eu não tinha coragem."

Fonte: Gshow