Na noite do dia 23 de setembro de 2016, o desabamento de parte do antigo Centro de Convenções da Bahia (CCB) assustou moradores do bairro Stiep, em Salvador, e deixou três pessoas feridas. Para o setor turístico, o que se viu nos anos seguintes foi um vazio de propostas por parte da gestão estadual, a ampliação de prejuízos e o enfraquecimento do estado enquanto destino para um nicho de mercado em franco crescimento: o turismo de negócios.

O CCB ocupava uma área de 153 mil metros quadrados (m²), com 57 mil m² de área construída. A estrutura projetada pelo engenheiro Carlos Emílio Meneses Strauch, exalava baianidade em esculturas e pinturas à frente do prédio, de autoria do artista plástico Bel Borba. Em 1993, o CCB passou por um amplo processo de reforma em suas estruturas. Em 2005, recebeu o Prêmio Caio, um importante reconhecimento no setor de eventos.

O CCB já estava fechado desde 2015, interditado por não apresentar projeto de combate a incêndio e pânico, assim como de manutenção predial. Assim, a queda da estrutura serviu apenas para escancarar o ocaso de um equipamento icônico para o turismo brasileiro. Inaugurado em 1979, foi responsável por elevar a força turística de Salvador e abrigou diversos eventos nacionais e internacionais, como o 12º Congresso da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2010.

Antes disso, sediou também a segunda edição da Conferência de Intelectuais da África e da Diáspora (II CIAD), evento promovido pela União Africana (UA) em parceira com órgãos governamentais brasileiros, entre os dias 12 e 14 de julho de 2006.

Pouco mais de dez anos antes de cair, em 2013, deu sinais de problemas na manutenção, quando uma bomba d'água que abastecia os banheiros deu defeito durante um grande congresso médico internacional, alimentando uma onda de notícias negativas à respeito do espaço.

Passados seis anos desde a tragédia, o local que sediou diversos congressos, feiras, shows e outros eventos, transformou-se em ruína e continua com destino indefinido, mesmo tendo tido a autorização para leilão aprovada pelo Legislativo em dezembro de 2021. Roberto Duran, presidente do Conselho Baiano de Turismo, avalia que o desabamento foi “a culminância de um processo de degradação do turismo de negócios e eventos que já se arrastava por pelo menos 10 anos”, e que contribuiu para a redução do parque hoteleiro na capital.

“Um grande centro de convenções é um indutor para esse segmento do mercado. Oficialmente, nesse período fechou pelo menos 31 bons hotéis em Salvador, entre eles ícones como o Pestana Bahia e o Bahia Otton Palace, além do Salvador Praia, entre outros”, explica Duran, que acrescenta também o valor arquitetônico agregado ao equipamento.

O laudo do Departamento de Polícia Técnica (DPT), concluído em 2017, apontou que o desabamento foi causado por excesso de oxidação da estrutura e por falta de manutenção.

ALBA aprova leilão do terreno
A última notícia pública de um possível destino para o que sobrou da estrutura aconteceu no final de 2021, quando o Executivo estadual encaminhou para a Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) um projeto de lei com pedido de autorização para venda de bens do Estado, dentre os quais o terreno do antigo Centro de Convenções.

A ação aconteceu após uma escala temporal de cinco anos desde a tragédia. Nesse período, houve anúncio de demolição feito logo após o desabamento; penhora do terreno como garantia de pagamento de dívida trabalhista de ex-funcionários da Bahiatursa; tentativa de furto de aparelhos de ar condicionado e fios do que restou da estrutura; anúncio de construção de um novo espaço no bairro do Comércio – não confirmado pelo Governo do Estado até a publicação desta reportagem – e, por fim, o anúncio de leilão.

A proposta foi aprovada pelo Legislativo no dia 7 de dezembro, com abstenção da bancada da oposição, que se retirou do plenário durante a votação, e os votos contrários de Hilton Coelho (PSOL) e Mirela Macedo (PSD). De acordo com o texto, a alienação ocorreria por meio da modalidade leilão e os recursos financeiros arrecadados seriam destinados ao Fundo Financeiro da Previdência Social dos Servidores Públicos do Estado da Bahia (Funprev) e outros investimentos.

A decisão da Alba, no entanto, foi contestada judicialmente pela representação jurídica dos 150 ex-funcionários da antiga Empresa de Turismo da Bahia S.A. (Bahiatursa). Uma ação movida pelo sindicato da categoria reivindica pagamento de salários e outros direitos trabalhistas não cumpridos, o que culminou na penhora do terreno como garantia. O processo está parado desde a contestação feita, de acordo com o escritório Pessoa e Pessoa, que representa o grupo. No dia 10 de dezembro, o governador Rui Costa sancionou o projeto de lei.

Procurado pela reportagem por meio da Secretaria de Comunicação (Secom), o Estado não respondeu. Na mensagem, enviada por e-mail após contato por aplicativo de mensagem com assessores da pasta, foram questionados o status atual em relação ao terreno; se há planejamento de construção de um novo equipamento de mesma finalidade em outro local e, finalmente, os impactos na economia local a partir do vácuo deixado pela ausência do CCB.

A deficiência da rede hoteleira, de acordo com Duran, continua sendo um impasse para o turismo local e impactando negativamente a captação de grandes eventos, apesar da retomada que vem sendo observada com a inauguração e o pleno funcionamento do novo Centro de Convenções da cidade, inaugurado em janeiro de 2020 pela prefeitura de Salvador.

Desafios para a retomada
Em agosto deste ano, impulsionada, sobretudo, pelas viagens corporativas, a rede hoteleira soteropolitana atingiu ocupação equivalente a 57,49%, segundo publicação da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-BA). Os hotéis voltados ao público de negócios apresentaram desempenho próximo aos dos hotéis de lazer.

Luciano Lopes, presidente da entidade, avalia que o turismo de negócios, com a retomada pós-pandemia do Centro de Convenções de Salvador, volta a ter movimentação. “Ainda é muito cedo. Estamos no final e uma pandemia. 2022 ainda não é parâmetro. Acredito que em 2023 a gente vá ter um crescimento maior do turismo de negócios em Salvador em decorrência dessa reabertura. Junto com o turismo de lazer isso pode crescer muito”.

Falar que a Bahia tem um grande potencial turísticos é praticamente uma redundância. A máxima, no entanto, requer a superação de alguns gargalos. Um deles, segundo Lopes, é de ordem estrutural, e requer reconhecimento do setor turístico como essencial tanto em nível local como nacional.

“Há a necessidade de uma política alinhada para a gente poder ter essa estrutura de forma consolidada. A gente vê iniciativas tanto do Estado como da prefeitura [de Salvador] de divulgação do destino, participação em feiras, mas a gente sente falta de um grande plano nacional de turismo, com diretrizes para os estados a partir de suas vocações turísticas”, releva.

No caso específico da Bahia, o gestor destaca como empecilho para o crescimento da atividade turística o reduzido número de voos internacionais que liguem o estado aos principais destinos. O aeroporto da capital dispõe atualmente de apenas duas rotas internacionais, com previsão de chegar a cinco até o final do ano. Os voos domésticos chegam a 30 atualmente.

O alto custo das passagens também é uma ameaça, inclusive para que se vislumbre retomada substancial em 2023. “Estão bastante elevadas. Isso requer, aí sim, um trabalho que envolve as prefeituras e o governo estadual para encontrar formas de dialogar com as companhias aéreas. Isso é uma ameaça para o verão, uma ameaça para o Carnaval. Talvez, não fossem o valor das passagens, já estaríamos com um ano bem melhor”, pontua Lopes. A lógica, explica, é a regra geral do mercado, quando maior a oferta, menor o custo. E vice-versa.

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O governo vai enviar um projeto de lei para a Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) pedindo autorização para venda de imóveis na capital e no interior. Na lista, estão a Rodoviária, o Detran e o Centro de Convenções, entre outros.

Segundo o governo, o valor dessas vendas será usado integralmente para o Fundo Financeiro da Previdência Social dos Servidores Públicos da Bahia (Funprev). A iniciativa tem objetivo de diminuir o histórico déficit previdenciário do Estado, que vem aumentando a cada ano.

O Parque de Exposições, que já teve edital de venda publicano no ano passado, não está nessa lista, que ainda não foi divulgada pelo governo.

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O governador Rui Costa comentou nesta segunda-feira (5) sobre a dívida trabalhista que ameaça a venda do antigo Centro de Convenções. Segundo ele, a negociação não deve ser emperrada por isso. "É uma questão de fácil resolução. Todo problema trabalhista o Estado assume e resolve. Aquela área, hoje, está no nome do Estado e ela será,sim, alienada" afirmou Rui, que visitou pela manhã as obras da Linha Azul.

O Centro de Convenções está em processo de penhora pela Justiça para quitar uma dívida milionária com mais de 160 ex-funcionários da Bahiatursa. A ação já se arrasta há 11 anos.

Segundo Rui, trata-se de uma situação complexa, mas que será resolvida, "O que acontece é que são áreas muito grandes. É diferente de você vender um lote pequeno de terreno. Uma área como essa demanda a montagem de um complexo com prédio residencial ou centro comercial é mais demorado", explicou.

No momento, o esforço é para divulgar a área para atrair possíveis interessados. "Pra alguém fazer um investimento de R$ 300 milhões é necessário um estudo mais aprofundado pra saber o que ele pode fazer com aquela área. É por isso que estamos fazendo uma primeira etapa que consiste em publicizar e valorizar nacionalmente a venda dessa área para chamar a atenção de fundos de investimento e empreendedores para conhecer o local e, eventualmente, daqui alguns meses, fechar a venda"

Dívida trabalhista
A dívida estadual, hoje, ultrapassa R$ 49 milhões. Ela existe porque o estado não cumpriu, de 1990 a 2008, o Plano de Cargos e Salários de mais de 160 funcionários da empresa. O acordo de promoções salariais estipulava um aumento de 6,03% a cada dois anos, o que não aconteceu.

O reajuste incidiria também sobre o FGTS, 13º e férias, e muitos dos funcionários que tinham direito foram admitidos na década de 1980 - ao menos 15 já morreram e os herdeiros aguardam a quantia.

Djalma Santana, 45 anos, é um desses herdeiros, junto com os seis irmãos. O pai deles, Jaime Santana, trabalhava para a Bahiatursa como motorista e morreu antes de ver o dinheiro cair na conta.

“Meu pai trabalhou 35 anos na Bahiatursa e nunca recebeu aumento. Sempre enrolavam dizendo que iam aumentar o salário, mas foram tapeando. Tudo depende da lei dos homens e a gente tá esperando receber”, afirma.

11 anos de tramitação
O processo tramita na justiça desde 2009 e a Bahiatursa já foi condenada. Porém, a sentença não foi executada porque a Procuradoria Geral do Estado (PGE), que defende o estado, não concorda com o valor e pede novo cálculo.

Atualmente, o processo está em nova fase de perícia contábil, para definir quanto cada funcionário irá receber. É o terceiro cálculo, segundo o advogado que representa o Sindicato dos Empregados em Empresas de Turismo do Município de Salvador (SETS), Pedro Ferreira.

O atual perito contábil disse à reportagem que o novo valor está sob sigilo e que não foi finalizado. O advogado do sindicato, no entanto, afirmou que cada servidor deveria receber de R$ 300 mil a R$ 400 mil. O valor total pode ultrapassar R$ 50 milhões.

Celeridade
O advogado do SETS explicou que a maioria dos trabalhadores é de idosos, por isso querem celeridade na execução da sentença. Eles tentam negociar um valor aceitável com o estado, para retirar a penhora - o prédio está arrestado, uma fase antes da penhora - e emitir os precatórios (que reconhecem dívida judicial do poder público).

Mas, na última audiência de mediação, em abril de 2018, o representante do estado não apareceu.

“As pessoas querem resolver e ficar com o precatório, porque elas não podem ficar esperando”, cobra.

O advogado do sindicato acredita que não haverá compradores para o imóvel enquanto a questão judicial não for resolvida.

A PGE informou que “ainda não houve decisão judicial sobre o valor do crédito dos reclamantes” e que “buscará reverter a decisão que determinou o arresto do Centro de Convenções, tendo em vista que se trata de bem público que, por força de lei, é impenhorável. O pagamento de qualquer crédito neste processo somente pode ser realizado por precatório”, diz nota.

O diretor da Secretaria da 34ª Vara do Trabalho de Salvador, Manoel Evangelista Neto, explicou à reportagem que, quando o processo de penhora foi iniciado, a Bahiatursa ainda era uma empresa de capital misto e não um bem público. A Bahiatursa disse que não podia se posicionar porque desde 2016 é superintendência e não empresa.

Os processos são públicos, têm mais de 5 mil páginas, e podem ser consultados através dos números 00781.00.83.2008.5050014 e 0017900-16.2009.5.05.0034 no site do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT5).

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