Matrículas abertas, menos distanciamento entre alunos e maior adesão ao ensino presencial. As escolas particulares de Salvador estão em fase de transição para ofertar aulas 100% presenciais, influenciadas, em parte, pela declaração do governador Rui Costa, na última terça-feira (14), do retorno pleno às aulas já acontecer em outubro. "Se continuar caindo como está hoje, números caindo, se continuar, em outubro a gente pretende voltar com as aulas normais", afirmou.

Esse retorno, no entanto, não significa voltar a como era antes da pandemia, mas ainda seguindo uma série de protocolos rígidos ou até sendo ofertado as aulas online para os alunos que ainda estão em casa. A Escola Tempo de Criança, localizada na Pituba, atende até o Ensino Fundamental I, ou seja, o 5º ano. Larissa Machado é a vice-diretora pedagógica do espaço. Ela conta que já foi emitido um comunicado informando os pais desse movimento de transição para o presencial.

“A partir de agora, só ofertamos online para crianças que precisam por quadro de saúde ou decisão da família de não voltar oficialmente. Os demais, que decidiram pelo retorno, devem ter o compromisso com as aulas presenciais”, explica. Segundo a professora, as aulas no formato híbrido (online e presencial ao mesmo tempo) permitiram que o aluno ou a família escolhessem quando queriam ou não ir para a escola.

“O online abriu a brecha de, por exemplo, famílias viajarem e deixarem o aluno, que ia presencialmente, participar da aula a distância. Isso não queremos, pois já temos turmas com todos estudantes indo para e escola. Precisamos criar um desenho de movimento de volta, até porque são diferentes os planejamentos de uma aula presencial e presencial com online. São estratégias diferentes”, aponta a educadora.

Nas turmas 100% presenciais, Larissa reforça que, quando a criança não puder ir para a escola e tiver que participar das aulas virtuais, os pais podem solicitar, mas com antecedência e justificativa. “Para ter acesso ao online, tem que ter uma solicitação prévia, informando um caso de saúde ou explicando as razões. Vai ficar assim até o final do ano ou, pelo menos, até quando a pandemia perdurar”, projeta.

Essa possibilidade da turma está toda em sala de aula se tornou possível graças ao Decreto Municipal 34.410, publicado na semana passada, que permite reduzir o distanciamento mínimo entre as carteiras dos estudantes de 1,5 metro para apenas um metro. “A queda nos números de contaminação e o avanço da vacinação dão segurança para essas decisões”, comenta Márcia Khalid, diretora do colégio Oficina. Por lá, a partir desta segunda-feira (20), só não vai para sala de aula quem realmente preferir ficar no online.

“Estaremos com quase a totalidade dos alunos na escola obedecendo um protocolo rígido de segurança, pois os cuidados têm que continuar. Antes, um grupo da turma vinha uma semana e outro vinha noutra. Agora, não vai precisar mais ter o rodízio, justamente por causa do menor distanciamento”, afirma Márcia.

Somente a prova continuará sendo online, para que seja feita em condições de igualdade para todos. Dos 600 alunos do Oficina, aproximadamente 40% estão em casa.

Localizado em Lauro de Freitas, o Colégio Perfil segue nessa mesma linha. “A maioria das turmas já estão 100% presencial, pois nossas salas são grandes. Nas que não conseguimos, estamos fazendo o rodízio e tem os alunos que optaram por ficar 100% online. Por prudência, ter literalmente todos os alunos em sala de aula, ou seja, sem o ensino online, só no ano que vem, com todos vacinados, o que vai dar segurança para o retorno total”, defende o diretor Wilson Abdon.

O Colégio Villa Global Education também está funcionando 100% presencial para as famílias que optaram na educação infantil e no ensino fundamental. No ensino médio, isso será a partir da segunda. “Quem quiser, ainda pode deixar seu filho em casa. A lei protege, dá essa condição para a família e nós a cumprimos”, diz Selma Brito, diretora de unidade.

Outra opção disponível no Villa é o ensino virtual assistido, feito para os pais que querem os filhos frequentando somente o online, mas não podem acompanhá-los nas aulas ou deixá-los sozinhos em casa. Esses pais podem levar os filhos para a escola e lá eles ficarão numa sala reservada e separada dos alunos e professores da turma, tendo apenas a assistência de um tutor. Esse modelo vai continuar durante e é visto como uma forma de trazer o aluno para a escola.

“Enquanto numa sala tem um grupo assistindo a aula presencial com a professora, em outra sala tem outro grupo acompanhando a aula de forma virtual, sendo assistido pelo profissional”, explica Brito.

Na segunda-feira (13), o Colégio Antônio Vieira (CAV) enviou às famílias dos cerca de 3,5 mil alunos um comunicado e formulário, por e-mail, para que optem pelo modelo totalmente presencial de ensino ou exclusivamente remoto. Somente após a definição do quantitativo de alunos optantes pelo totalmente presencial é que será anunciada a nova configuração das aulas e se será necessário manter ainda algum tipo de revezamento.

No Vieira, a escolha dos pais pelo modelo totalmente presencial ou exclusivamente remoto não poderá mais ser alterada até o final do ano letivo, a menos que haja alguma mudança de conjuntura pandêmica, devidamente regulamentada pelos órgãos oficiais. ”O aluno que escolher pelo modelo presencial terá registro de frequência somente se estiver na sala de aula”, diz a instituição, em nota.

Já a Escola Cresça e Apareça, que atua no Ensino Infantil, não trabalhou em nenhum momento com aulas online. “Nós optamos por fazer um número de matrículas que obedece ao número do protocolo. Então, estamos 100% presencial desde a reabertura”, conta Mariana Mongenroth, diretora da instituição. Com a redução do distanciamento entre os alunos para apenas um metro, a escola já começou a receber novos alunos.

“Teve duas matrículas novas essa semana. Na educação infantil, faz muita diferença estar na escola, nem que seja por alguns meses. Faz diferença muito grande para a formação da criança. Qualquer tempo em sala de aula é precioso e a pandemia foi traumática para algumas famílias, pois trouxe marcas no desenvolvimento dos pequenos”, diz Mariana.

A prefeitura de Salvador cogita retomar as aulas presenciais na próxima segunda (27). A secretaria de Educação da Bahia foi procurada, mas não respondeu até o fechamento do texto

Pais divergem sobre retorno
A administradora Andréa Dantas, 41 anos, mãe de Gael Benício, 8 anos, e Constance Marrie, 11 anos, assim que pôde mandou seus filhos para a escola. Primeiro, eles estudaram no modelo híbrido. Depois, a família optou pelo virtual assistido ofertado pelo Villa, no qual os alunos já puderam ir todos os dias para a escola. Agora, com a redução do distanciamento para um metro, as crianças já estão no 100% presencial.

“Meus filhos ficavam triste quando não tinham que ir para escola. Eles mesmos diziam que era um dia sem aula, pois não entendiam que em casa, no online, era uma aula de verdade. Meu esposo não tinha como acompanhar por causa do home office dele super pesado e eu já tinha voltado a trabalhar presencialmente. Então, meus filhos estavam sozinhos e era bem complicado. Hoje observo uma diferença no aprendizado deles, pois na escola eles estão acompanhados de pessoas que são especializadas em ensinar”, diz Andréa.

Já a diarista Sirlete Santos da Silva, 43 anos, não deixará suas duas filhas irem para a escola em 2021. Elas estudam num colégio municipal do Resgate que está em reforma e, por isso, as aulas continuam sendo todas online. “Caso as obras fiquem pronta esse ano, eu não vou deixá-las retornarem”, diz a mãe, preocupada com a pandemia.

“Elas não se sentem segura e eu também não. O vírus ainda está circulando e tem muita gente que não está se cuidando. Nas aulas online que pude presenciar, vi os próprios alunos comentando isso, dizendo que o pessoal da casa não usa máscara, vai para festa e não se cuida. Como eu vou deixar minhas filhas frequentarem a sala de aula com esses colegas?”, questiona.

Fez exatos 9 meses, na última quinta-feira (17), que as escolas estão com as portas fechadas pela pandemia do novo coronavírus. Apesar de não receberem os alunos nas estruturas físicas, a maioria das escolas particulares se adaptou à modalidade de ensino virtual, o que pode perdurar até o ano que vem. A única certeza, anunciada pelo Grupo de Valorização da Educação (GVE), que reúne cerca de 60 instituições privadas de ensino de Salvador e Lauro de Freitas, em coletiva realizada ontem, é que as escolas voltarão em fevereiro de 2021 - a maioria logo na primeira semana. O retorno das aulas presenciais, no entanto, ainda não tem data prevista.

Tanto o prefeito de Salvador, ACM Neto, quanto o governador da Bahia, Rui Costa, já colocaram como condição a chegada da vacina para a covid-19. Sem definição, os gestores escolares também cobraram um posicionamento do poder público em relação aos protocolos que devem ser aplicados e ao planejamento para o ano letivo de 2021.

Se não houver autorização dos órgãos municipais e estaduais, a modalidade virtual será mantida, sem redução das mensalidades dos alunos. Se o ensino presencial for autorizado, a tendência é que as aulas funcionem de forma híbrida e facultativa, em que cada família escolherá se o estudante voltará a frequentar a escola.

“É essencial para o setor de educação que as autoridades nos apresentem um projeto para o ano letivo de 2021. Estamos falando da construção de cenários possíveis, que vão estar submetidos às condições de saúde que a pandemia trouxer. É fundamental a construção desses cenários para que nós possamos fazer aquilo que em educação é fundamental, que é planejar”, reivindica a diretora do colégio Oficina, Maria de Lourdes Viana.

A diretora pontua que vem solicitado às autoridades esse “norte”, mas que não houve, até agora, uma resposta efetiva sobre. “Não tivemos ainda a publicação de um protocolo de segurança sanitária e é fundamental que seja feito com antecedência, porque precisamos construir culturas, desenvolver procedimentos e treinar pessoal para que esses protocolos sejam seguros”, destaca.

Ela ainda defendeu que a educação pública e privada seja vista como setor essencial, a fim de que os trabalhadores desta área sejam priorizados nos programas de vacinação. “Precisamos que o setor de educação pública e privada na Bahia seja tratado como setor essencial. A consequência imediata disso seria fazer com que os trabalhadores da educação tivessem prioridade para a vacinação. É fundamental para dar mais tranquilidade e mais segurança a todos nós”, conclui a diretora do Oficina.

Protocolos sanitários prontos
Sem um protocolo oficial a ser seguido, o GVE estabeleceu as próprias regras sanitárias, com ajuda de uma equipe médica, coordenada pelos infectologistas Roberto Badaró e Adriano Oliveira. Segundo Viviane Brito, CEO do Villa Global Education, eles estão prontos desde maio e quase todas as instituições já adaptaram os espaços. Algumas escolas farão a testagem dos profissionais, como é o caso da Villa Global Education, que tem um quadro de 330 trabalhadores. “Nossa defesa é pela educação e pela saúde, portanto, pela vida. [...] Todos os profissionais serão testados antes do retorno das atividades presenciais. Além disso, fizemos uma pesquisa ativa, acompanhamos, diariamente, todos os profissionais, assim como os alunos. Faremos isso também no retorno, uma pesquisa ativa e, diariamente, eles vão preencher um formulário que vai nos dar condição de acompanhar nossa comunidade”, garante Viviane.

A educadora também explicou que os estudantes e profissionais que estiverem com sintomas e suspeita de covid-19 serão direcionados para salas especiais e que cada funcionário terá um EPI (Equipamento de Proteção Individual) específico para cada função. “Temos espaços reservados para acomodar os casos suspeitos e também estabelecemos uma parceria muito forte com as famílias, de observar atentamente se seu filho está com alguma disfunção”, conta Brito.

Crianças mais ansiosas
O GVE ainda fez um balanço sobre o estado emocional das crianças, mais isoladas com a pandemia. De acordo com a diretora da Escola Girassol, Rosa Silvany, elas se encontram mais ansiosas e a família relata quadros de bruxismo e constantes pesadelos. “As crianças que estão online desligam as câmeras, dizem que estão cansadas, têm bruxismos, pesadelos, quando entram na sala de aula começam a roer as unhas de forma compulsiva, tristeza, mesmo em uma aula dinâmica e alegre, a gente vê uma expressão tristonha”, relata Rosa. A diretora do Girassol ainda disse que alguns pais levam os filhos para a porta das escolas, para atenuar a saudade.

“No momento em que essas crianças aparecem com essas situações mais externas, elas estão somatizando, e, de alguma forma, elas estão adoecendo. E isso tem causado uma tristeza generalizada, automaticamente vai para o pai e para a mãe, quando causa uma tristeza dos filhos. Então começa a haver uma tristeza e adoecimento familiar generalizados e as consequências são graves se a gente rapidamente não reverter”, alerta Silvany.

Segundo a diretora Mariana Mongeroth, da Escola Cresça e Apareça, voltada para educação infantil, as crianças têm desenvolvido distúrbios de sono e alimentares. “Tenho tido reuniões semanais com um grupo de pediatras da cidade que me atualiza sobre os dados de consultório. Eles detectaram ansiedade, perda da habilidade motora nas crianças de 0 a 5 anos, distúrbio de sono, distúrbios relacionados à alimentação e isso varia de público e privado. Então você tem desnutrição em crianças de escolas públicas e obesidade nas crianças de escola privada, pela falta de atividade física”, afirma Mariana.

Francisco Mendonça, coordenador do colégio Módulo Criarte, ressalta que as escolas só conseguiram superar a crise financeira por conta da MP 936, que possibilitou a redução de salários e carga horária dos funcionários. Segundo ele, esse desconto foi repassado para as famílias. “Durante o ano de 2020 as escolas tiveram economia de custo por conta das reduções de salários dos professores e funcionários. Tivemos redução também de energia, água, vale-transporte. E toda essa economia foi transferida para as famílias através de desconto”, disse o coordenador. Ele não informou, contudo, quanto foi reduzido da folha de pagamento e quanto de redução de mensalidade foi dada aos familiares.

Com o término da vigência da medida provisória em dezembro, Mendonça alerta que algumas escolas podem vir a falência: “Sem esse benefício, não teríamos como fazer mágica e dar esse desconto às famílias. Não teria condições de manter essas escolas. E o retorno de todos os custos das escolas, se não tiver matrícula, não vai poder pagar 13º, férias, o salário de fevereiro. Elas vão falir, especialmente as de educação infantil, cujo trabalho online não funciona para essas crianças bem pequenas”.

O porta-voz do GVE, Wilson Abdon, que é diretor do Colégio Perfil, pontua que a demanda das famílias para que haja esse retorno presencial cresceu. “Em junho, quando fizemos a primeira pesquisa, a intenção das famílias que não queriam retornar porque não se sentiam seguras era em torno de 75%, 80%. Ou seja, só 20% queria o retorno das aulas presenciais. Hoje esse número está em 50%. Metade quer e metade não querem retornar. Por isso que o retorno será facultativo e com segurança. Queremos que as autoridades entendam e possam ter autorização para o retorno”, explica Abdon.

Procuradas, a Secretaria Municipal de Educação e a Secretaria Estadual de Educação afirmaram que não há previsão de retorno para as aulas presenciais. O decreto do governo estadual que suspende as atividades escolares tem validade até 4 de janeiro de 2021.