O preço do tomate salgou o tempero dos baianos. O produto aumentou de 50% a 133% entre 1 de outubro e 29 de novembro deste ano, segundo o Centro de Abastecimento da Bahia (Ceasa), da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado da Bahia (SDE). O que mais encareceu foi o tomate de segunda, de menor qualidade, cuja caixa de 20 a 22 quilos, saltou de R$ 30 para R$ 70 (+133,3%).

Nos mercados de Salvador, o preço do tomate chegou a R$ 8,98 o quilo, na rede Hiper Ideal. Em um mercado na Baixa de Quintas, o produto ainda é encontrado por R$ 5,20/kg. Para driblar o aumento, os baianos passaram a consumir menos a fruta. Macarronada ao sugo e à bolonhesa terá molhos menos vermelhos, já que o ingrediente está mais raro nas receitas.

A assistente administrativa Sarah Fonseca, 19, consumia de 1,5 kg a 2 kg de tomate por semana. Agora, compra essa mesma quantidade a cada 30 dias. Ou seja, seu consumo reduziu mais de 75%. “Só sei cozinhar com tomate, cebola e pimentão. É a base da minha comida. Então, continuo comendo todo dia, mas reduzi a quantidade”, conta Sarah.

Em um almoço com uma amiga, ela modificou uma receita para não gastar tanto. “A gente foi fazer macarrão à bolonhesa. Eram muitos tomates para fazer o molho, não me recordo quantos, mas a gente só usou dois, porque não dá para cozinhar sem tomate”, explicou a assistente administrativa.

O aumento de preço do tomate rasteiro, que foi de 50% no último mês, tem diminuído a margem de lucro dos restaurantes italianos de Salvador. É o caso do restaurante Bottino, no Rio Vermelho. Em outubro, a cantina pagava R$ 2,60/kg. Agora, o mesmo produto passou a custar R$ 4 - uma alta de 53,8%. “Toda vez que existe aumento de alguma matéria-prima, principalmente, que a gente usa em abundância, a gente perde margem”, reconhece Claudio Bottino, dono do restaurante. Ele pontua que não repassou o preço para os clientes nem fez alterações no cardápio.

Aumento geral

Não foi só em Salvador que o preço do tomate disparou. Várias outras capitais tiveram alta, de acordo com o último levantamento do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (Ipca), de outubro. Em Belo Horizonte (MG), o aumento foi de 36%; em Vitória (ES), 48%; e na cidade de Goiânia (GO), 33%. “A média de preços foi muito elevada em praticamente todas as regiões do Brasil, não foi algo específico de Salvador”, afirma Guilherme Dietze, economista da Federação do Comércio do Estado da Bahia (Fecomércio-BA).

Segundo ele, houve uma redução da produção do tomate, o que fez encarecer os preços. “Tivemos uma estiagem muito grande e, logo na sequência, uma geada. Isso complicou a safra e o plantio de alguns produtos como o tomate. Daí vem uma produção bem mais baixa, que acarreta um preço mais elevado”, esclarece o economista.

Contudo, ele acredita que a situação deva se normalizar no próximo mês. “Voltamos a ter período chuvoso e isso, de certa forma, melhora a produção. Pode ser um indicativo de que o aumento foi pontual e não uma inflação geral”, estima Dietze.

Conab

A Companhia Nacional de Abastecimento, empresa vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), explicou, por meio de nota, que, em outubro, houve pouca disponibilidade do produto no mercado, por conta de vários fatores, e isso afetou o preço do tomate em novembro.

“As geadas de julho provocaram perdas na lavoura e necessidade de replantio, postergando a disponibilidade do produto no mercado. Além disso, as temperaturas um pouco mais amenas seguraram o amadurecimento do fruto, reduzindo ainda mais sua oferta. As chuvas também contribuíram com o cenário, na medida em que dificultam o andamento da colheita”, esclarece a Conab.

A companhia ainda afirmou que o nível de oferta atual deriva da diminuição da área plantada na safra de inverno e que os dados oficiais do Ceasa/BA ainda não foram repassados para o governo federal.

A Federação da Agricultura e Pecuária da Bahia (Faeb) confirma que houve redução da área plantada. "O aumento do valor do tomate é devido à redução de área plantada, reflexo dos aumentos dos custos de produção, como alta dos insumos. Além disso, esse período é de safra em Pernambuco e Paraíba, mas é um período de plantio do hortifruti aqui na Bahia", pontua a Federação.

O coordenador de Estudos e Projetos Agrícolas da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura (Seagri), Marcelo Libório, acrescenta ainda que o ciclo da cultura do tomate é curto e isso influencia diretamente no preço. "Se a lavoura for bem conduzida, com cerca de seis a sete meses ela se esgota.

Essa característica de ser uma cultura rápida faz com que o produtor se planeje em função do preço. Quando ele percebe que o mercado está demandando o fruto ele planta, ele deixa de plantar ou reduz a área", explica Libório.

Na Bahia, a região que se produz tomate é, principalmente, a Chapada Diamantina, nos municípios de Mucugê e Ibicoara. "Nessa região, se encontram os grandes produtores. Já no entorno desses municípios, estão os pequenos e médios produtores", informa Marcelo Libório.

Como economizar

Uma forma de se esquivar dos altos preços é fazer como Sarah Fonseca, lá do começo da reportagem: comprar menos. Ao menos, a estratégia deve ser adotada até que o preço dê uma aliviada, orienta a presidente do Movimento de Donas de Casa e Consumidores da Bahia (MDCCB), Selma Magnavita.

“O consumidor pode deixar de usar até que baixe o preço, porque é a demanda que faz o preço. Se você não consome, o tomate vai ficar na prateleira. E vão ter que desovar baixando o preço ou jogando fora”, aconselha Selma.

Ela pontua que os aumentos de preço estão cada vez maiores. “Tudo que está aumentando de preço, está aumentando desastrosamente. Não são mais 20, 50 centavos. Agora são R$ 3 ou mais. O consumidor precisa observar isso para driblar a carestia, substituindo, trocando de marca, ou não comprando. Se tiver a necessidade absoluta de comprar aquele produto, compre menos. Porque se não fizer isso, vai sempre abalar o bolso”, recomenda.

Selma Magnavita ainda diz que é mais vantajoso, em vez de comprar a fruta, optar pelos molhos de tomate já prontos. Além disso, vale até mesmo substituí-lo por alimentos de coloração semelhante, como cenoura, abóbora, caqui, melancia e goiaba, e abusar de temperos como páprica e cúrcuma. “É preciso deixar de ser radical no uso do tomate nas receitas, trazendo a criatividade”, conclui.

Restaurantes italianos sofrem com escassez de tomate pelati

Os restaurantes italianos de Salvador que trabalham com o tomate pelati - do tipo enlatado, sem casca - relatam a escassez do produto. Importado, o produto chega à capital de navio, transportado direto da Itália pelo Atlântico. “Além do aumento do preço, a falta do tomate, principalmente enlatado, tem atrapalhado bastante. O preço está só aumentando. Em outubro, a gente pagava R$ 24 por uma caixa de 2kg. Agora, estamos fazendo cotação e está R$ 33”, conta a supervisora de compras do restaurante Di Liana, Tábata Polecco.

Em breve, Tábata diz que será preciso fazer um reajuste no preço dos pratos. “A gente não consegue achar com nenhum fornecedor e estamos tentando achar onde tem, comprando pelo preço de mercado, tentando negociar. Mas o valor está muito alto. Por enquanto, não estamos tendo prejuízo, porque essa falta tem só 15 dias. Mas vamos reajustar o cardápio”, afirma a supervisora de compras, que não sabe ainda de quanto será o reajuste.

Já no restaurante Bela Napoli, no Caminho das Árvores, foi feito um estoque de tomate pelati, quando se soube que o setor ia ter problemas com o abastecimento. “Quando vi que estava tendo isso, pela experiência, a gente já saiu buscando no mercado. Comprei antes da alta da procura e fiz estoque até dezembro, porque a gente não pode deixar que isso afete o preço ou repassar para os clientes”, esclarece Gian Angelino, dono do Bela Napoli. O preço normal que ele pagava em uma caixa de 20 kg de tomate pelati era R$ 45 a 50. No final de outubro, ela chegou a custar R$ 140. Agora, está em torno de R$ 100.

Para as baianas de acarajé, a situação também está difícil. Se o tomate continuar a subir de preço, o vinagrete da baiana vai sumir, segundo a presidente da Associação Nacional das Baianas de Acarajé (Abam), Rita Santos.

“Não temos como repassar os preços dos insumos para os clientes, porque os clientes também estão sem dinheiro”, explica Rita. “O que vai acontecer é não colocar a salada, se continuar no preço que está”, alerta. Ela comprava, há um mês, o quilo de tomate por R$ 2,95. Hoje, a mesma quantidade está por R$ 5,99 - um aumento de 103%.

Preço do tomate:
G Barbosa: R$ 7,95
Big Bompreço: R$ 8,19/kg
Hiper Ideal: R$ 8,98/kg
Rede mix (Pituba): R$ 5,98/kg
Mercado Acupe de Brotas: R$ 5,89/kg
Mercado Super Barato (Baixa de Quintas): R$ 5,20/kg

Aumento do tomate de outubro para novembro*:
Tomate Extra - R$70 para R$120 (+71,4%)
Tomate Primeira - R$60 para R$90 (+50%)
Tomate rasteiro - R$60 para R$110 (+83,3%)
Tomate segunda - R$30 para R$70 (+133,3%)
*Caixa de 20 a 22kg

Fonte: Ceasa/SDE

Um dia de comemoração para lá de diferente. É isso que as quituteiras mais famosas de Salvador terão hoje, no dia das baianas de acarajé. Sem a missa tradicional de comemoração que acontece há 35 anos e com um faturamento bem abaixo do normal por causa da pandemia, para elas o que se tem para comemorar é a vida e a possibilidade de participar do retorno da economia.

Ainda em fase de recuperação, faturando de 50 a 60% do que obtinham antes da pandemia, as baianas lamentam o ano difícil mas compartilham da esperança do aumento das vendas desde o retorno. De acordo com informações da Associação Nacional das Baianas de Acarajé, Beiju, Mingau e Similares (Abam), em território soteropolitano, existem cerca de 3.500 baianas de acarajé - o número deve ter caído já que muitas quituteiras optaram por alternativas para superar as dificuldades.

Com esse panorama, as baianas ouvidas pela reportagem do CORREIO declararam que o dia delas se converte num momento de gratidão pela vida e pela oportunidade de ainda estarem fazendo o que mais amam: vender acarajé. Esse é o depoimento de Elaine Assis, 39, filha de Dinha do Acarajé, que reduziu em 80% as venda na pandemia. Para ela, trabalhar depois de um ano tão difícil é o motivo dos agradecimentos: “A gente tem que comemorar a vida e a possibilidade de estar trabalhando todos os dias já é uma vitória”.

Outras baianas de acarajé viram sua renda ser reduzida a zero com o isolamento social iniciado em março. Sem o delivery para reduzir as perdas, sofreram ainda mais. É o caso de Márcia da Cruz, 62, do Porto da Barra: “A pandemia acabou com a nossa renda, meu filho. Um período muito difícil que fez com que muitas colegas tivessem que deixar o tabuleiro. Eu tive a sorte de ainda continuar trabalhando, o que já me deixa contente e com motivos de sobra pra agradecer”.

Jussara Santos, 42, que trabalha no Acarajé da Cira, localizado no Largo da Mariquita, no Rio Vermelho, concorda que é preciso comemorar e lamenta a situação das colegas baianas que precisaram fechar o tabuleiro. “Não tá perfeito, longe disso. Sofremos com tudo que aconteceu, mas ainda estamos aqui, conseguimos voltar a vender e pagar as nossas contas. Com tanta baiana que precisou encontrar outras formas de ganhar dinheiro, me sinto abençoada“ de ainda abrir isso aqui", afirma”.

Os relatos que informam a necessidade que muitas baianas tiveram de parar com a venda de acarajé são confirmados por Rita Santos, presidente da Abam. Ela conta que recebeu várias informações de que um número considerável de baianas precisaram optar por trabalhos alternativos, mas não sabe precisar quantas foram. “Não temos como fazer o censo no momento, mas as baianas de acarajé estão em menor número em Salvador e na Bahia como um todo”, explica.

Para Jussara, o retorno das vendas tem dado esperança: “Hoje, já voltamos a vender 80% do que vendíamos antes. Então, apesar de não ter sido um ano fácil, ele vai terminando com aquela luz no fim do túne”. A situação é parecida no Acarajé da Dinha, que já fatura valores que fazem com que as contas fechem no verde. “Estamos com uma taxa de venda de 60% em relação aos valores de antes de toda essa crise. Dá pra fechar as contas, mas é uma situação diferente das baianas com pontos menores, que sofreram e ainda estão lutando para continuar com o tabuleiro aberto”, explica Elaine.

“Ainda tá tudo muito difícil, meu filho. Não voltou nem metade do que era antes. As barracas maiores estão se recuperando mais rápido, nós estamos mais atrás nisso. O bom do fim do ano é saber que não vou fechar”, diz Márcia.

Cole com as baianas

Além de Márcia, muitas outras baianas passam pela mesma situação e chegam até a depender da ajuda da Abam, que com uma campanha do CORREIO para arrecadar doações para as baianas, já distribuiu 2.800 cestas básicas.

A pandemia segue e as baianas continuam sofrendo com um faturamento inferior ao necessário, o que gera uma renda para suas famílias. Por isso, cole com as baianas e ajude depositando qualquer quantia na seguinte conta bancária para que as doações sejam revertidas em cestas básicas.

ABAM - Associação Nacional das Baianas de Acarajé, Mingau, Beiju e Similares.
Caixa Econômica Federal
Código Operação: 003
Ag.: 4802
Conta corrente: 000056-1
CNPJ: 02561067000120

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