A poderosa missa pela alma do condenado à morte

A poderosa missa pela alma do condenado à morte

As missas de sufrágio pelas almas de condenados à morte no Brasil colonial eram concorridas. E a explicação, conforme o folclorista Câmara Cascudo, se deve ao fato de o suplício da forca ser sofrimento grande, capaz de limpar os pecados do condenado. Diziam que, nessa época, era comum espíritos de enforcados aparecerem pedindo mais missas, indicando dinheiro escondido e "botando moral" na turma dos pecadores.

Nesse teatro da vida e da morte, que aos olhos de hoje parece um tanto surreal, o condenado era autorizado a sair escoltado da cadeia e bater de casa em casa a fim de pedir esmolas visando arrecadar o dinheiro da espórtula, a missa pela sua alma. Ele gritava: “uma esmola para missa do enforcado”. E, aí de quem se negasse a contribuir… Pegaria mal não só para a comunidade terrestre como a celeste.

A celebração dessa missa tinha ares bizarros. O condenado a ouvia de joelhos no momento que era retirado da cela para a forca. E não tinha o direito de assisti-la até o final. Quando o sacristão tocasse o sininho, no momento do “sactus, sanctus, sanctus” a escolta levava o sentenciado para o patíbulo. O padre não podia permitir que o pecador recebesse a hóstia para logo depois ser enforcado.

O código penal imperial, de 1830, não previu a figura do carrasco, de modo que entrava em cena o “jeitinho brasileiro” para saber como proceder, ou seja, executar o preso. Um juiz de Direito de Brejo de Areia (Paraíba) expediu ofício, em 1834, para o Ministro da Justiça, Aureliano Coutinho perguntando quem iria ser o carrasco de uma execução local. O ministro mandou o juiz nomear como algoz um “sentenciado à mesma pena” ou, em falta desse, qualquer outro preso, daí ser comum, conforme Cascudo, ouvir o “carrasco ad hoc”, pedir desculpas ao colega ao levá-lo ao cadafalso.

Um mimo final era concedido ao condenado. Antes de subir ao patíbulo, as senhoras caridosas ofereciam como última refeição, pão de ló e vinho do porto.

Em tempo, somente depois de algumas sentenças é que se criou a figura do algoz, devidamente remunerado, para executar os condenados à morte no Brasil.

 

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Biaggio Talento, jornalista, colaborador do O Jornal da Cidade.

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