O herói de hoje já foi o vilão ontem

O herói de hoje já foi o vilão ontem

As cenas de moradores em quarentena de diversas cidades do mundo – presos em suas casas devido a quarentena - aplaudindo médicos, numa justa homenagem à categoria que está na linha de frente no combate à pandemia de coronavírus, representam a vitória da ciência frente a superstição e a ignorância.

Isso pelo fato de ter havido um tempo, de trevas, em que em vez de serem tratados como heróis, os médicos tinham a imagem de vilões e eram responsabilizados pela disseminação das doenças e de práticas sacrílegas. No século XIX, durante a pandemia do colera morbus, os trabalhadores ingleses consideravam que a doença teria sido urdida por uma trama de médicos, farmacêuticos, comerciantes e governo pra matar os mais pobres. Os médicos também intencionavam obter cadáveres para as aulas de anatomia já que, legalmente, só podiam usar corpos de condenados à morte. Na Escócia, uma escola de anatomia foi destruída. Em Manchester registrou-se episódio semelhante durante essa mesma onda.

Na Rússia, os boatos propagavam a tese segundo a qual os médicos estavam envenenando as fontes de água pra reduzir a população. A mesma fakenews do envenenamento surgiu na Hungria quando as autoridades de saúde estavam colocando cloreto de cálcio nos poços de abastecimento para, justamente, purificar a água.

Na França, médicos e estudantes de medicina eram agredidos nas ruas e em Moscou inúmeros profissionais da saúde foram chacinados em 1831.

O medo de internação nos hospitais era enorme, pois as pessoas entendiam que quem entrava nas casas de saúde não saia com vida ante a sanha assassina dos “homens de branco”.

No Brasil, um dos ataques mais notórios aos profissionais da saúde ocorreu em 1904, no Rio de Janeiro, na chamada “Revolta da Vacina”. A insurreição teve grande adesão entre os moradores dos cortiços, agitados por segmentos da elite política e clérigos que chamavam a vacinação contra a varíola (promovida pelo sanitarista Oswaldo Cruz) de “um presente de Satã para se apoderar da alma de incautos”. A revolta resultou em 23 mortos, dezenas de feridos e mil presos.

Apesar de alguns personagens que ainda rosnam contra as medidas adotadas nos dias de hoje pelos médicos e especialistas para combater o coronavírus, a ciência venceu.

 

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Biaggio Talento é jornalista, e colaborador do O Jornal da Cidade.

 

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