Pastores são condenados a 21 anos de prisão pela morte de Lucas Terra

Pastores são condenados a 21 anos de prisão pela morte de Lucas Terra

Os pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda foram condenados a 21 anos de prisão pelo assassinato do adolescente Lucas Terra. A sentença foi proferida pela juíza Andréia Sarmento às 21h35, desta quinta-feira (27), após três dias de julgamento no Fórum Ruy Barbosa.

Em 21 de março de 2001, Lucas Vargas Terra, de 14 anos, foi estuprado e queimado vivo por membros da Igreja Universal.

Os pastores foram julgados por homicídio triplamente qualificado por motivo torpe, impossibilidade de defesa da vítima e meio cruel com o uso de fogo. O crime de ocultação de cadáver prescreveu, ou seja, encerrou o prazo legal para punir pelo crime.

Em 2012, o pastor Silvio Galiza, também acusado, chegou a ser preso e condenado a 18 anos. Entretanto, teve progressão de regime, cumpriu a pena e hoje está em liberdade condicional. Foi através do depoimento de Galiza que Fernando e Joel foram denunciados pelo Ministério Público.

Tentativa da defesa
Apesar do julgamento estar marcado desde 2021, houve na semana passada uma solicitação dos acusados que ameaçou adiar ainda mais o júri. A defesa dos pastores entrou com um pedido de digitalização do processo de Silvio Galiza no dia 17 deste mês.

No dia 18 de abril, o Ministério Público estadual (MP-BA) se manifestou favorável ao pedido de adiamento do julgamento dos pastores. Entretanto, a solicitação da defesa não foi para adiante e o julgamento começou na última terça-feira (25).

Igreja Universal
A Igreja Universal divulgou uma nota a respeito dos depoimentos de testemunhas durante o júri popular dos pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda. A igreja afirma que acredita na inocência de pastores. Os dois condenados têm cerca de 32 anos de vínculo com a igreja e não foram afastados.

Primeiro dia de julgamento
Primeiro dia de júri do caso Lucas Terra foi marcado por emoção e contradições de testemunhas. Após a oitiva de outras três testemunhas de acusação e uma testemunha de defesa de Joel Miranda, a última testemunha de acusação a ser ouvida foi a mãe da vítima, Marion Terra. Ela revelou que não teve apoio da Igreja Universal do Reino de Deus ou de algum dos seus pastores em nenhum momento depois da morte do filho.

Marion Terra também disse que não ficou surpresa quando Silvio Galiza, pastor auxiliar condenado por envolvimento no caso, afirmou que Fernando Aparecido da Silva e Joel Mirando tinham sido os verdadeiros assassinos de Lucas.

"A gente sempre achava que o Galiza não tinha feito aquilo sozinho. Sempre achávamos que era o Fernando, desde o início, porque logo depois que aconteceu o crime, ele reuniu cerca de 800 obreiros cinco dias depois e proibiu que eles ajudassem nas buscas. Naquele momento, ninguém nem sabia de que forma Lucas estava, não havia nem sido encontrado o corpo ainda. Ele [Fernando] disse que eles não podiam se envolver, enquanto igreja, por causa de um Luquinhas qualquer, que um soldado morto tem que ser deixado para trás", relembrou.

Por duas vezes, Marion chorou perante o júri ao detalhar os momentos da descoberta do desaparecimento do filho, a notícia da sua morte e a dificuldade enfrentada por ela e sua família para conseguir identificar o corpo de Lucas através de um exame de DNA que foi feito apenas 42 dias após a noite do crime, dada a dificuldade de identificação de tecidos no corpo carbonizado.

Além de Marion, logo após o recesso, quem prestou depoimento foi Sueli Santos de Jesus, assistente promovida a obreira que, à época do crime, conviveu com Lucas e foi uma das últimas pessoas que viram o garoto com vida. Às 15h10, o júri retornou do recesso e Sueli depôs como testemunha de acusação. Ela confirmou a declaração do antigo obreiro Martoni, testemunha ouvida pela manhã, reiterando que ela e outros fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus, na Santa Cruz, foram proibidos de procurar Lucas após seu desaparecimento.

Beljair de Souza Santos era o pastor à frente da Igreja na Santa Cruz na época do crime. Segundo Sueli, na noite da morte de Lucas, ela o viu ao lado de Silvio Galiza após o culto. Na ocasião, Galiza afirmou que estava aguardando para buscar alguns documentos na mão de Beljair, já que ele havia sido transferido para a igreja do Rio Vermelho naquela semana. Ela não sabe, no entanto, se esse era o real motivo para a presença de Silvio ali.

No depoimento, Sueli ainda definiu a relação de Lucas Terra com Silvio Galiza como 'abusiva'. "Ele controlava toda a vida de Lucas. Queria mandar no menino. Eu dizia que ele parecia o pai dele, porque nunca vi uma relação igual aquela", frisou. Sueli participou das buscas, mas isso custou sua permanência na igreja. "Todos que participaram da busca acabaram expulsos", relembrou.

Convidado a depor pela defesa do pastor Joel Miranda, o pastor Beljair de Souza Santos negou a versão apresentada por Sueli, alegando que nunca reuniu os obreiros com o intuito de proibi-los a continuar na busca por Lucas Terra na época do seu desaparecimento. Ao contrário do que foi dito pela outra testemunha, ele afirmou que incentivou a procura pelo menino.

Ao ser indagado pela acusação, Beljair também disse que, quando o crime ocorreu, morava com sua esposa, o pastor Joel e a esposa dele no bairro da Pituba. A declaração apresentada contradiz o depoimento dado pelo pastor em 2008. Naquele ano, ele afirmou que na época do crime morava em uma área residencial próxima à Av. Paralela.

Pressionado por todos os lados, Beljair não respondeu se estaria sujeito à punição caso dissesse algo que comprometesse a Igreja Universal. Pastor há 30 anos, ele admitiu que sua função na igreja é sua única fonte de renda e que qualquer informação que falasse no júri a respeito de ordens recebidas por superiores seria motivo para ser chamado para uma conversa interna na instituição religiosa, a qual disse evitar.

Segundo dia
No segundo dia do júri popular foram ouvidos o pastor Allan dos Santos Bárbara, auxiliar da Igreja Universal da Pituba na época do crime, e o bispo Jadson Santos Edington, que era pastor da regional da Pituba quando o crime ocorreu. De acordo com a acusação, Fernando e Joel assassinaram Lucas porque o jovem flagrou os dois em pleno ato sexual.

Pela tarde, o Tribunal do Júri ouviu, além de Claudineia Aparecida de Freitas Silva e Eliane da Silva Miranda, esposas dos réus, Gilberto da Silva Carvalho, que era pastor da igreja do Vale das Pedrinhas, o bispo Maurício Gonzaga Amaral da Silva, antigo pastor da igreja da Catedral, a obreira Carmen Lúcia Magalhães, a administradora financeira encarregada de conferir e registrar a prestação de contas diária na Catedral, Lilian Santos da Silva Luz Sousa, e a voluntária Rosangela Dantas Costa dos Santos, que atuava na área administrativa, também na Catedral.

O pastor Gilberto da Silva Carvalho relembrou que foi o responsável pela primeira sanção de Silvio Galiza na Igreja Universal. Na época, ele era pastor da igreja no Nordeste de Amaralina e tinha Silvio como seu auxiliar, mas não estava satisfeito com suas atitudes, alegando que Silvio brincava em excesso. "Ficava abraçando homens e mulheres, brincava muito. Eu, como homem de Deus, não aprendi assim. Falava com ele e era o mesmo que nada", relatou.

Ao reportar o comportamento aos bispos, Gilberto viu Silvio ser transferido para a igreja da Santa Cruz. Um tempo depois, ele próprio foi designado a comandar a igreja do Vale das Pedrinhas, subordinada à igreja da Pituba, que tinha o pastor Joel Miranda como líder.

Segundo Gilberto, na noite do crime os suspeitos Fernando Aparecido e Joel Miranda estavam na igreja na Pituba até às 21h40 e era impossível, dado o movimento após o culto, que eles tivessem tido alguma relação sexual. "Não tem como, porque imagine, estava lá vários pastores com as esposas. Não tinha como", reiterou.

O bispo Maurício Gonzaga Amaral declarou que foi traído por Silvio Galiza quando perguntado se não desconfiava do seu caráter e afirmou que acreditava plenamente na inocência de Fernando e de Joel.

Claudineia Aparecida de Freitas Silva e Eliane da Silva Miranda, esposas dos réus, prestaram um depoimento emocionado e choraram ao lembrar o momento em que receberam a notícia de que seus respectivos maridos estavam envolvidos no caso. Ao rememorar as dificuldades enfrentadas durante a prisão de Joel, Eliane chorou. O choro comoveu Joel e Fernando que, pela primeira vez, também choraram diante dos jurados.

As testemunhas Carmen Lúcia Magalhães, Lilian Santos da Silva Luz Sousa e Rosangela Dantas Costa dos Santos e Eliane da Silva prestaram depoimento, mas responderam apenas aos questionamentos da defesa, uma vez que foram dispensadas pela acusação.

Contradições

Durante o depoimento de Claudineia Aparecida de Freitas Silva, esposa de Fernando, houve confusão entre as equipes de defesa e acusação, que divergiram a respeito do que havia sido dito pela testemunha. De acordo com a acusação, Claudineia teria afirmado, durante depoimento no júri de Silvio Galiza, que Lucas procurou Fernando "no dia, um dia ou dois dias antes do crime" com o objetivo de buscar sua gravata, acessório que simbolizava sua formatura como obreiro, função que já desempenhava na Igreja Universal do Rio de Janeiro.

Contudo, Claudineia disse que viu Lucas pela última vez no Rio de Janeiro. A defesa rebateu a tentativa de argumentação da acusação, esclarecendo que Claudineia não havia dito que viu Lucas no depoimento anterior, mas que quem o teria visto foi seu marido. Ambas as equipes interromperam o andamento da oitiva e trocaram acusações entre si.

Já no depoimento de Eliane da Silva Miranda, esposa de Joel Miranda, houve contradição quanto a noite do crime. Segundo Eliane, ela e Joel moravam naquela época com o pastor Beljair e sua esposa e, na noite do dia 21 de março, ela e Joel estavam em casa às 22h. No entanto, entre 22h e 22h30 acontecia todos os dias na Catedral a prestação de contas dos pastores das igrejas da região. Sendo pastor, era dever de Joel participar da prestação nesse horário, o que impossibilitava que ele estivesse em casa, conforme indicava o depoimento de Eliane.

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  • STJ determina que médicos peritos federais mantenham atendimentos

    O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Og Fernandes, concedeu, na noite passada, liminar pedida pelo governo para limitar a greve de peritos médicos federais marcada para esta quarta-feira (31). Pela decisão, a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP), que está à frente do movimento paredista, fica obrigada a manter em atividade 85% dos peritos no Distrito Federal e em 18 estados – Alagoas; Amazonas; Amapá; Bahia; Ceará; Distrito Federal; Espírito Santo; Goiás; Maranhão; Mato Grosso; Pará; Paraíba; Pernambuco; Piauí; Paraná; Rio Grande do Norte; Rondônia; Sergipe e Tocantins.

    Nos demais oito estados – Acre, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo – devem permanecer em atividade 70% dos peritos. De acordo com o STJ, deve ser garantido o funcionamento das atividades de perícia médica de análise inicial de benefícios e direitos previdenciários e assistenciais. A diferença nos percentuais se dá em função dos diferentes tempos de espera para agendamento das perícias, que são mais longos em estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

    Fernandes, que está responsável pelo plantão judicial do STJ, acolheu os argumentos da União, que apontou a essencialidade do serviço. “De fato, as atividades médico-periciais estão afetas a benefícios de subsistência da população, cuja paralisação pode colocar em perigo iminente a sobrevivência e a saúde da comunidade envolvida”, disse o ministro.

    Segundo o governo, duas paralisações anteriores da categoria impediram a realização de 10 mil perícias, que são etapa imprescindível para concessão de benefícios como auxílio-doença e de prestação continuada (BPC). Isso prejudica principalmente a população mais pobre, argumentou a União.

    O vice-presidente do STJ decidiu apenas em relação aos percentuais mínimo de peritos que devem ser mantidos em atividade. Fernandes não analisou outros pedidos da União e não entrou no mérito da legalidade do movimento grevista. Tais pontos devem ser analisados pelo relator do caso, ministro Mauro Campbell. Os médicos peritos federais reivindicam reajuste salarial de 23% e a realização de novos concursos públicos para contratação de pelo menos 1.500 profissionais. A categoria reivindica o cumprimento de acordo fechado com o governo para encerrar uma greve de 52 dias realizada em 2022.

  • Caso Marielle: PF investiga se regularização de condomínio na Zona Oeste do Rio teria motivado assassinato

    Conforme publicado pelo blog do colunista Lauro Jardim, no último domingo, a delação premiada de Lessa foi para o STJ. Isso indica, como O GLOBO informou ontem, que o nome citado pelo ex-PM tem foro por prerrogativa de função. Caberá ao ministro Raul Araújo decidir se aceita ou não o acordo de colaboração.

    A regularização fundiária já tinha surgido na investigação da morte de Marielle e do motorista Anderson Gomes ainda em 2018.

    As negociações da PF com Lessa tiveram início logo após os agentes federais assumirem o caso, em fevereiro do ano passado. Logo que o presidente Lula foi eleito, ele pediu ao então ministro da Justiça Flávio Dino que tentasse esclarecer o crime contra a parlamentar e o motorista Anderson Gomes, ocorrido em 14 de março de 2018. Com a proximidade de o crime completar seis anos, as trativas aceleraram. Primeiro buscou-se levantar a resposta sobre o mando com o também ex-policial militar Élcio de Queiroz, que atuou como motorista na emboscada contra Marielle. Mas como a informação sobre o assassinato da vereadora era compartimentada por Lessa, ou seja, ele não passava todos os detalhes para quem agia com ele nos crimes, Élcio citou apenas o nome de Domingos Brazão, sem muitos detalhes.

    Sem evidências suficientes, os agentes federais do Grupo Especial de Investigações Sensíveis (Gise) — grupo especializado na elucidação de casos complexos — dependiam exclusivamente de Lessa para chegar à pessoa que mandou matar a parlamentar. No fim do ano passado, logo após o ex-PM aceitar a colaborar com o caso Marielle, o STJ realizou duas sessões secretas para confirmar qual seria o foro das tratativas iniciais do acordo de delação premiada de Lessa.

    Nas sessões secretas, foi discutida se a negociação da delação deveria tramitar sob os cuidados do Ministério Público Federal (MPF) ou do Ministério Público do Rio (MPRJ). Em virtude de o caso ser sigiloso, as sessões foram realizadas a portas fechadas, sem a presença de público. Segundo ministros que participaram das sessões, a conclusão final foi pela competência do MPF para acompanhar as tratativas.

    Embora a delação coubesse ao MPF, coube ao Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio acompanhar as investigações, uma vez que são eles que conhecem com profundidade o processo dos homicídios de Marielle e Anderson. Para que Lessa colaborasse, os agentes da PF e procuradores da República ofereceram várias vantagens ao ex-PM para que indicasse o mandante.

    De acordo com o artigo 473 do Código de Processo Penal, não se pode prometer a absolvição ao delator. Como ele cometeu um homicídio, ou seja, um crime contra a vida, considerado pela Constituição um bem maior, tal benefício não pode ser oferecido. Cabe ao júri a decisão, por ser soberano. Essa cláusula tem que estar, inclusive, presente na delação de Lessa. No julgamento dele no IV Tribunal do Júri, que ainda não foi marcado, deverá ser perguntado aos jurados se eles aceitam que o réu tenha benefícios de redução de pena. O júri decidirá ao responder os quesitos na sala secreta. A Constituição prevê que crimes hediondos não cabem fiança, anistia ou graça.

    Entre os benefícios oferecidos a Lessa estão a proteção integral à mulher e os dois filhos, além do retorno dele para um presídio fluminense. O prazo para que Lessa continue preso em uma penitenciária federal expira no dia 21 de março. No último dia 17, o Sistema Penitenciário Federal (SPF) se manifestou desfavorável à possibilidade de mandá-lo para uma prisão no Rio. No parecer, diretoria do órgão se opõe a essa possibilidade “devido a sua rede de contatos pessoais, intra e extramuros, além de sua experiência com a criminalidade em vertentes diversificadas”. No documento, a diretoria do órgão, vinculado ao Ministério da Justiça, cita seu “altíssimo grau de periculosidade”, com “potencial de desestabilizar” o sistema prisional de seu estado de origem. O ex-sargento da PM está preso atualmente na Penitenciária Federal de Campo Grande, no Mato Grosso. Já Élcio, está numa unidade federal em Brasília.

    Dos investigados por mandar matar a parlamentar, até o momento, apenas o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Domingos Brazão tem foro privilegiado. Como Domingos Brazão é o único investigado com foro, ele disse ao GLOBO que é inocente e afirmou que, se Lessa o apontou como mandante é porque quer proteger alguém:

    — Eu venho sangrando na cruz há algum tempo com essa acusação. Pelo menos cinco anos. Já fui investigado por todas as esferas: Polícia Civil, Ministério Público e Polícia Federal. Ninguém conseguiu provar nada contra mim. Não acredito que esses servidores estivessem dispostos a colocar suas carreiras em jogo para me proteger. A investigação da morte da Marielle e do Anderson prendeu vários milicianos e nenhum está ligado a mim, porque não me misturo a essa gente — defendeu-se Brazão, afirmando ser inocente.

    O conselheiro do TCE disse que, como "bom filho de português", sempre foi muito trabalhador. Como perdeu o pai aos 18 anos, um pecuarista na área de Jacarepaguá, Brazão, mesmo sendo o caçula dos seis irmãos, passou a proteger a mãe e o restante da família. Ele contou que antes de entrar na política, sua paixão, ele vendia carros e motos. Em seguida, virou empresário, dono de 18 postos de gasolina. Atualmente, só tem um estabelecimento desse tipo. O investimento agora é em galpões em áreas de baixo valor para revenda para grandes empresas com preços elevados.

    Brazão já foi deputado estadual com expectativa de presidir a Assembleia Legislativa, mas disse que acabou assumindo uma vaga como conselheiro do TCE. Lembrou dos seis anos de afastamento devido à Operação Quinto do Ouro, quando cinco integrantes do tribunal foram presos e afastados dos cargos acusados de corrupção.

    Perguntado sobre a possibilidade de Lessa tê-lo apontado como mandante, Brazão respondeu:

    — Lessa deve estar querendo proteger alguém.

     

    Fonte: O Globo

  • Brumadinho tem mais de 23 mil acordos de indenização fechados

    Mais de 23 mil atingidos pelo rompimento da barragem da Vale na Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, em Minas Gerais, fecharam acordos de indenização com a mineradora. Os dados são das instituições de Justiça e foram apresentados na última sexta-feira (19), quando o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) organizou uma prestação pública de contas. No evento, foi feito um balanço dos três anos de implementação do acordo de reparação.

    Nesta quinta-feira (25), a tragédia completará cinco anos. O rompimento da barragem causou 270 mortes e gerou grande devastação ambiental, além de destruir comunidades. Familiares dos mortos contabilizam 272 vítimas, levando em conta que duas mulheres estavam grávidas. Um acordo para a reparação foi firmado dois anos depois, em 4 de fevereiro de 2021. Ele trata dos danos coletivos. Foram previstos investimentos socioeconômicos, ações de recuperação socioambiental, ações voltadas para garantir a segurança hídrica, melhorias dos serviços públicos e obras de mobilidade urbana, entre outras.

    As partes optaram por manter as discussões das indenizações individuais em paralelo nas negociações judiciais e extrajudiciais que estavam em curso. Em parte dessas tratativas, os atingidos foram acompanhados pela Defensoria Pública de Minas Gerais. Em abril de 2019, a instituição assinou com a Vale um termo de compromisso definindo os procedimentos que viabilizaram as negociações individuais.

    De acordo com a Defensoria Pública, por meio do termo de compromisso, foram gerados até dezembro 20.806 acordos que movimentaram R$ 1,3 bilhão. A esses números, se somam as indenizações trabalhistas. Isso porque mais de 90% dos funcionários que morreram estavam trabalhando no complexo minerário e eram empregados da Vale ou das empresas terceirizadas que prestavam serviço na Mina Córrego do Feijão.

    Em julho de 2019, a mineradora e o Ministério Público do Trabalho (MPT) assinaram um acordo para o pagamento das indenizações aos familiares dos trabalhadores que morreram e aos empregados sobreviventes. Desde então, foram selados 2.509 acordos que movimentaram R$ 1,2 bilhão.

    Em nota, a mineradora afirma que, desde 2019, mais de 15,4 mil pessoas fecharam acordos de indenização. "A Vale reafirma seu profundo respeito às famílias impactadas pelo rompimento da barragem e segue comprometida com a reparação de Brumadinho, priorizando as pessoas, as comunidades impactadas e o meio ambiente", acrescenta o texto.

    A divergência entre os números apresentados pela Vale e os divulgados pela Defensoria Pública e pelo MPT pode se dar porque alguns atingidos têm direito a mais de um acordo, como, por exemplo, no caso daqueles que perderam parentes e sofreram outros impactos. Mas também há divergência nas cifras envolvidas. A Vale alega ter destinado ao todo R$ 3,5 bilhões em indenizações.

    Sem negociação
    Para a Associação dos Familiares das Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem em Brumadinho (Avabrum), esse processo indenizatório foi atropelado. A entidade considera que não houve negociação. Era aceitar a oferta ou recusar.

    "Até teve uma escuta, mas não havia espaço para argumentos. E foi tudo muito em cima do acontecido. A gente ainda estava com 197 pessoas não encontradas, em meio ao caos, e as reuniões sobre as indenizações já tinham começado", diz a engenheira civil Josiane Melo, que integra a diretoria da Avabrum, e faz duras críticas ao acordo. Ela perdeu sua irmã Eliane Melo, que estava grávida de cinco meses.

    Josiane se recorda que havia um temor relacionado com um artigo da reforma trabalhista. Aprovada em 2017 por meio da Lei Federal 13.467 e sancionada pelo então presidente Michel Temer, ela definia que o pagamento máximo para indenização por danos morais em caso de acidente de trabalho deveria ser de 50 vezes o valor do salário do empregado.

    Dessa forma, os parentes de uma vítima que tivesse um salário de R$ 3 mil, por exemplo, não poderiam receber juntos mais do que R$ 150 mil. Apenas no ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou ilegal essa limitação. Assim, na época, como os valores definidos entre Vale e MPT era superiores aos previstos na lei, havia pouca esperança em conseguir melhores condições.

    "Falavam muito dessa questão do limite. Usou-se dessa possibilidade", diz Josiane. A engenheira civil avalia que as famílias ficaram acuadas. Ela, no entanto, não gosta de falar do tema. "A vida não tem reparação. Não há valor que compre uma vida. A vida não volta atrás, então pra gente nós somos os mais miseráveis. Nós perdemos aquilo que a gente tinha de mais especial que é o convívio com os nossos entes familiares, a construção dos nossos sonhos e da nossa família", acrescenta.

    Houve, porém, atingidos que preferiram buscar a indenização de forma individual, recorrendo a advogados particulares. Isso ocorreu tanto na Justiça do Trabalho como na Justiça comum. Em alguns casos, porém, a expectativa de obter cifras mais elevadas acabou sendo frustrada já que os juízes utilizaram como referência os termos firmados pela Vale com o MPT e com a Defensoria Pública. Ou seja, percorreram um outro caminho, mais demorado, para obter resultados semelhantes.

    Mas houve exceções. Em setembro de 2019, por exemplo, a mineradora foi condenada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) a pagar R$ 11,8 milhões de indenização por danos morais a quatro familiares que perderam entes queridos na tragédia. As vítimas estavam hospedadas na Pousada Nova Estância, que foi soterrada pela lama de rejeitos.

    Uma das críticas da Avabrum envolve a discrepância entre os recursos destinados às indenizações e aqueles anualmente aprovados para distribuição de lucros e dividendos. Somente no último ano, a Vale pagou cerca de R$ 28,9 bilhões em proventos aos seus acionistas.

    Liquidação coletiva
    Em março do ano passado, uma decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) chegou a estabelecer um novo ingrediente para o processo indenizatório. O juiz Murilo Silvio de Abreu acolheu pedido do MPMG e concordou com a possibilidade de liquidação coletiva. Dessa forma, os atingidos, caso quisessem, poderiam pleitear suas indenizações de forma conjunta. No momento, porém, a decisão está revogada.

    Essa era uma demanda antiga de algumas entidades que representam as vítimas. Elas avaliam que, na negociação individual, o atingido se encontra numa posição mais vulnerável diante da mineradora.

    A decisão foi tomada pelo juiz Murilo Silvio na mesma ação em que a Vale foi condenada em 2019, de forma genérica, a reparar todos os danos da tragédia, incluindo aí os individuais, sejam eles patrimoniais (como danos materiais e lucros cessantes) e extrapatrimoniais (como danos morais e estéticos).

    Com a etapa de liquidação coletiva instaurada, se iniciaria a fase de definição de parâmetros para identificar as pessoas que têm direito à indenização, bem como os valores dessas indenizações. Para tanto, os atingidos poderiam contar com os levantamentos das assessorias técnicas que eles escolheram para auxiliá-los. Algumas delas já possuem uma matriz de danos, por meio do qual podem calcular em um processo coletivo as indenizações de cada um.

    Também havia sido fixado pelo juiz a inversão do ônus da prova. Ou seja, se o atingido alegar que sofreu um dano não reconhecido pela Vale, caberá à mineradora provar que o dano não ocorreu. A decisão nomeava ainda como perita a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Caberia a ela prestar auxílio ao juízo na hora de arbitrar os valores indenizatórios.

    Em setembro, porém, Murilo reconheceu que tomou a decisão sem intimar a Vale para se manifestar e se retratou. Ele abriu prazo de 10 dias para que a mineradora apresentasse seu posicionamento. A decisão anterior foi revogada. A Vale argumentou que a fase de liquidação não pode ser iniciada porque há estudos periciais ainda em curso, os quais serão suficientes para identificar todos os danos individuais e valorá-los. Também defendeu a liquidação de forma individual como meio mais adequado.

    Transferência de renda
    No mês seguinte ao rompimento da barragem, a Justiça mineira determinou que a Vale iniciasse o pagamento de um auxílio emergencial mensal aos atingidos. O valor fixado era de um salário mínimo por adulto, a metade dessa quantia por adolescente e um quarto para cada criança. Inicialmente, faziam jus ao benefício todos os moradores de Brumadinho, sem distinção. Nos demais municípios atingidos, o auxílio foi concedido a pessoas que residem até um quilômetro de distância da calha do Rio Paraopeba.

    Ainda no fim de 2019, ocorreu uma alteração. O critério para acesso ao benefício foi mantido, mas o valor foi reduzido pela metade para quem não residisse em comunidades diretamente afetadas pelo rejeito.

    A redução dos valores aumentou a insatisfação das comunidades atingidas que já faziam outras críticas relacionadas com a implementação do auxílio: se queixavam do critério geográfico e também do poder de decisão que se encontrava nas mãos da Vale. Era a mineradora que avaliava se cada atingido tinha ou não direito ao repasse.

    O acordo firmado em 2021 buscou atender algumas reivindicações. Foi criado um programa de transferência de renda sob gestão da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em substituição ao auxílio emergencial mensal. Além disso, foram reservados R$ 4,4 bilhões dos R$ 37,68 bilhões a serem aportados pela Vale conforme firmado no acordo.

    Pedidos negados
    A FGV teria autonomia inclusive para reavaliar todos os pedidos anteriormente negados pela mineradora. Tantos os auxílios mensais que haviam sido pagos pela Vale, como os repasses feitos através do programa instituído pelo acordo não se confundem com as indenizações individuais. O primeiro busca assegurar as condições de vida e o segundo é uma reparação pelos danos causados.

    O programa teve início em novembro de 2021. Embora tenha sido estruturado para durar quatro anos se encerrando em outubro de 2025, ele deverá ser implementado por mais tempo. De acordo com a FGV, os R$ 4,4 bilhões destinados ao programa foram empregados em um fundo e os rendimentos já proporcionaram um acréscimo patrimonial significativo. Dessa forma, ele poderá prosseguir pelo menos até abril de 2026.

    Atualmente, o repasse médio é de R$ 648 por pessoa. Alguns atingidos recebem valores diferenciados, como aqueles que são familiares dos mortos e os que viviam ou ainda vivem na chamada zona quente, onde estão os bairros mais impactados. Segundo dados da FGV, há 132.094 beneficiados, cerca de 17 mil a mais na comparação com os dados de seis meses atrás.

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