Você provavelmente já foi até uma das praias do litoral de Camaçari, que fica a cerca de 50 km de Salvador, mas será que conhece a cidade? Sabia, por exemplo, que ela tem o segundo maior crescimento absoluto populacional da Bahia (4.906 pessoas em um ano)? É a cidade da Região Metropolitana de Salvador que mais cresce em termos percentuais (1,61% em 2021) e a terceira do estado no ranking de taxa de crescimento populacional em 2021. Hoje é comemorado o aniversário de 263 anos de Camaçari, e voc~e vai conhecer a história da cidade e como ela se tornou essa atual potência.
Maria Luiza D’Errico é uma daquelas camaçarienses que podem dizer que, quando chegou à cidade, tudo era mato. Ela tem 69 anos e mora em Camaçari desde os 5. Ela se mudou de Candeal para lá em 1956 quando seu pai, que era policial militar, foi transferido.
A moradora conta que, quando era criança, Camaçari era uma cidade de veraneio que sobrevivia da agricultura. “As ruas não eram asfaltadas, a energia era a motor com horário de ligar e desligar, a água a gente buscava na fonte. Eu tomava banho de rio, ia comprar pão na padaria, e a carne do sol que a gente comprava vinha no papel de embrulho”, diz.
Maria Luiza destaca ainda que a cidade deu um salto a partir da chegada do Polo Industrial, instalado no município em 1978. “Chegaram muitos imigrantes em busca do ‘ouro’, a população foi crescendo e a gente foi ganhando escolas, praças, se desenvolvendo fisicamente”, acrescenta a moradora.
O historiador, professor e pesquisador Diego Copque confirma. “Temos uma explosão demográfica em Camaçari por conta do advento do Polo Petroquímico. E muitos estudiosos utilizam essa instalação como marco na cidade, porque a partir daí temos a instalação de diversas indústrias e, principalmente, a fábrica da Ford, que intensificou ainda mais esse crescimento”, diz.
Mas esse desenvolvimento, segundo Maria Luiza, também tem um outro lado. Camaçari acabou se tornando uma cidade da mistura. “É uma cidade que até hoje é formada por pessoas de vários cantos da Bahia e do Brasil. Temos uma mistura de cultura, de linguajar, de costumes. Com isso, as pessoas têm dificuldade de assumir a identidade de camaçariense e ainda dizem ser de outras localidades. Eu não nasci aqui, mas assumo essa identidade. Eu amo essa cidade e não pretendo sair daqui”, diz.
A estudante Milena Furtado, de 22 anos, é uma das novas moradoras. Ela se mudou de Salvador para Camaçari em 2019, quando foi aprovada para o curso de Direito no campus da Universidade do Estado da Bahia (Uneb) que fica na cidade. A adaptação foi lenta, mas hoje Milena diz que adora a cidade.
“Eu cheguei sem conhecer ninguém e senti uma diferença para Salvador, porque na capital eu morava no Corredor da Vitória, e o Gleba E, onde eu moro agora, é um bairro que fica um pouco distante do centro de Camaçari. E cheguei com medo porque todo mundo me dizia que a cidade tinha fama de ter muito violenta, mas eu vi que não era isso tudo, que toda cidade tem violência. Aprendi a gostar da cidade, principalmente pelas praias e barzinhos”, conta a estudante.
E, com a pandemia, a cidade precisou abrir espaço para ainda mais gente. É que pelo menos 100 mil pessoas se mudaram para um dos nove municípios que compõem a região do Litoral Norte da Bahia em 2020. Este foi o número de pedidos para novas ligações de energia elétrica na região, de acordo com dados da Coelba. E, num sinal de que este movimento de expansão dificilmente será algo efêmero, este ano, o volume de pedidos para novas ligações está 13% acima do que se verificou no ano passado, aponta a concessionária de energia.
Cidade Industrial
Com a chegada do Polo, Camaçari ganhou a fama de Cidade Industrial. A estrutura é a maior da Bahia e, no começo, abrigava diversas indústrias químicas e petroquímicas, mas, com o passar dos anos, passou a contar com outros ramos, como automotivo, de celulose, borracha, metalurgia do cobre, têxtil, fertilizantes, energia eólica, bebidas e serviços. É o primeiro complexo petroquímico planejado do Brasil e o maior complexo industrial integrado do Hemisfério Sul, com mais de 90 empresas instaladas.
Mais recentemente, outro destaque foi a fábrica da Ford, inaugurada em 12 de outubro de 2001, sendo a primeira fábrica de automóveis a se instalar no Nordeste. A fábrica fechou as portas em 12 de maio de 2021. Mas até 2018, ano mais recente divulgado pelo IBGE, o PIB da cidade contabilizava R$ 23,8 bilhões, o segundo maior do estado, abaixo apenas de Salvador. O número estava entre os 50 maiores do país (em 39º lugar). No recorte de indústria, no entanto, o município ocupa a liderança, com o maior PIB industrial da Bahia.
Em 2018, a indústria gerou um valor de R$ 9,4 bilhões, o 17º maior valor adicionado para esse setor entre todos os municípios brasileiros. Com um PIB elevado e uma população não tão grande (309.208 pessoas na estimativa de 2021), Camaçari tinha ainda, o 4º maior PIB per capita da Bahia (R$ 81.106).
Cidade turística
Camaçari tem 42 km de litoral, a maior extensão da Região Metropolitana, reunindo cerca de 30 praias paradisíacas que contribuem para o turismo na cidade. As principais delas são: Busca Vida, Abrantes, Barra do Jacuípe, Guarajuba, Itacimirim, Jauá e Arembepe.
Em Camaçari, está a mais tradicional aldeia hippie do Brasil, em Arembepe e, na direção do interior, o Parque das Dunas de Abrantes e o Mirante do Cruzeiro. Também em Vila de Abrantes está a igreja mais antiga do município; construída pelos jesuítas há mais de 400 anos e as nascentes protegidas das quatro principais bacias hidrográficas responsáveis pelo abastecimento de água de toda a Região Metropolitana de Salvador.
Para o historiador Diego Copque, Camaçari tem um grande potencial turístico, mas não o explora como deveria. “Camaçari tem um potencial muito forte para o turismo, tanto quanto Salvador, mas isso não é devidamente explorado. É preciso ir além das praias, pensar em algo voltado para uma perspectiva étnica e histórica. Temos aqui três das igrejas mais antigas do Brasil (Igreja do Espírito Santo, Igreja de Monte Gordo e Igreja de Barra do Jacuípe), o que pode ajudar no turismo religioso”, destaca.
História da cidade
Em 1558, às margens do Rio Joanes, os jesuítas João Gonçalves e Antônio Rodrigues formaram a Aldeia do Divino Espírito Santo. Logo depois, surge a Companhia de Jesus, um espaço para catequizar os índios Tupinambás que viviam aqui.
Em 1624, sob a liderança do bispo D. Marcos Teixeira, diversas autoridades foram acolhidas na vila e, junto com os índios, organizaram tropas de resistência que ajudaram a expulsar os holandeses da Bahia.
Em 28 de setembro de 1758, o local se emancipa e um decreto assinado pelo Marquês de Pombal muda o nome do povoado para Vila de Nova Abrantes do Espírito Santo. Pouco depois, passa a se chamar somente Vila de Abrantes, quando tinha cerca de 500 casas e 1.200 habitantes.
Em 1920, após o governador Francisco Marques de Góes Calmon mudar a sede do município de Abrantes, o distrito de Camaçari é criado no novo local. Cinco anos depois, passa a se chamar Monte Negro. Finalmente, em 1938, através de decreto, o município passou a ser chamado de Camaçari.
“Camaçari sempre foi um local estratégico para a capital, tanto que o aldeamento surge em 1558, nove anos depois da fundação de Salvador. Ela nasce, junto com outras localidades, como um dos cinturões de defesa da costa, servindo como barreira do litoral para que corsários não invadissem Salvador”, ressalta o historiador Diego Copque.
Confira a programação de aniversário:
As comemorações na cidade começaram ainda nessa segunda-feira (27). Na véspera do aniversário, foi inaugurado o novo Horto Florestal Linaldo da Silva. A inauguração contou com a presença do prefeito Elinaldo da Silva, do vive-prefeito José Tude e do presidente nacional do Democratas, ACM Neto. O parque ecológico, situado na região central da cidade, passou por transformação para ofertar atividades de lazer, educação e proteção do meio ambiente. O local conta com 11 ambientes para visitação.
Nesta terça-feira (28), acontece um ato simbólico de hasteamento da bandeira da cidade. A prefeitura não divulgou horário e local do ato por conta do limite de pessoas imposto pela pandemia. O evento será restrito às autoridades.
Na quarta-feira (29), acontece o Desfile Cívico Virtual, promovido pela prefeitura através da Secretaria da Educação (Seduc). Com a temática “Escolas presentes em cenário de esperança”, cerca de 400 estudantes, personalidades das comunidades e gestores educacionais contribuíram com a construção do projeto que será transmitido pela TV Câmara, no Canal 25.1 da TV Litorânea, e também pelo YouTube da instituição, às 14h.
Curiosidades sobre Camaçari
Camaçari vai do Rio Joanes até o Rio Pojuca. Mata de São João não faz parte de Camaçari, mas Açu da Torre, que hoje faz parte de Mata de São João, pertenceu a Camaçari até 1924.
O nome da cidade, que inicialmente era escrito como Camassary, tem origem tupi-guarani e significa ‘árvore que chora’, por conta do orvalho que cobria a copa das árvores da espécie Caraípa densifolia com gotículas de água. Hoje, a espécie é escassa na cidade porque a madeira já foi bastante utilizada para construção.
Em Camaçari, existe a mais tradicional aldeia hippie do Brasil, em Arembepe. A fama da vila vem, principalmente, da força do movimento hippie dos anos 60. Simpatizantes do mundo inteiro frequentavam o local pregando o “paz e amor”. Astros como Mick Jagger, Janis Joplin e os integrantes dos Novos Baianos eram alguns dos rostos conhecidos que passavam por lá.
Camaçari possui diversas unidades de conservação ambiental espalhadas em seu território como: a Unidade de Conservação da Bacia Hidrográfica do Rio Joanes I, Unidade de Conservação Rio Capivara, Cinturão Verde de Proteção do Complexo Petroquímico de Camaçari, Parque das Dunas de Abrantes, Unidade de Conservação Lagoas de Guarajuba e Parque Garcia D´Ávila.
Há um projeto de lei sendo escrito para propor a correção da data de aniversário da cidade. A data de fundação se confunde com a data de emancipação. A cidade comemora no dia 28 de setembro o aniversário de emancipação política e civil dos povos indígenas do Brasil, e não de fundação. A fundação é, na verdade, em 29 de maio de 1558, o que acrescentaria 200 anos ao município.
Camaçari foi importante no processo de independência no Brasil na Bahia. O tema do 2 de Julho, foi recentemente discutido em julho deste ano no primeiro encontro que ocorreu em Lauro de Freitas para tratar da inclusão dos municípios de Lauro de Freitas, Camaçari, Dias D’ Ávila e Mata de São João, nas comemorações em 2023 do bicentenário da Independência da Bahia e da inclusão desses municípios no roteiro da passagem do Fogo Simbólico.