Bahia registrou mais de 20 mil processos por horas extras em 2021

Bahia registrou mais de 20 mil processos por horas extras em 2021

Não é incomum funcionários de empresas precisarem ultrapassar o limite do expediente estabelecido em contrato de trabalho, fazendo horas extras. O ideal é que nesses momentos seja feito um acordo entre patrão e empregado. Mas, dados do Tribunal Regional do Trabalho da 5° Região (TRT) apontam que mais de 20.934 processos por jornada excedida foram registrados neste ano, superando os números do ano passado, 20.880.

Apesar do aumento em relação a 2020, os dados de 2021, representam diminuição de 21% nos processos registrados em 2019, que foi de 26.643. O problema aí é que de 2019 para 2020 houve redução nesses índices, mas eles agora voltaram a crescer, o que pode indicar relações de trabalho mais precarizadas diante do avanço do desemprego por conta da crise econômica agravada com a pandemia de covid-19.

A advogada Ana Paula Studart explica que horas extras estão sempre entre os temas mais frequentes no direito trabalhista. De fato, dados do Tribunal Superior do Trabalho, última instância da área, apontam que as horas extras foram o segundo assunto mais recorrente em outubro de 2021. Com 35 mil processos, ficando atrás apenas dos honorários advocatícios.

Miriam Santos, 50, trabalhou durante 15 anos com carteira assinada no setor de serviços gerais em um centro comercial de Salvador. Ela conta que não tinha muito problemas com o antigo patrão, mas que depois que ele adoeceu e a filha passou a controlar o negócio, ela começou a ter os direitos trabalhistas desrespeitados.

Ela conta que muitas vezes passava do seu horário de trabalho, que era até às 17h: “Chegava a ficar até às 20h e nunca recebi hora extra”, diz Miriam, que lembra ainda que era comum o pagamento do seu salário atrasar e que, às vezes, não recebia o vale transporte.

Nesses casos, a funcionária tinha de ir andando de sua casa, na Boca do Rio, até o local de trabalho, uma caminhada que demorava mais de 20 minutos, em média.

Quando Miriam foi reclamar com a patroa sobre a situação, foi demitida. Isso foi em outubro do ano passado e, desde então, não recebeu a rescisão. Ela, que tem filho pequeno, está desempregada até hoje. Depois do ocorrido, procurou um advogado e está com um processo em andamento na justiça para receber o que lhe devem, inclusive as horas extras.

O que diz a lei

Ana Paula Studart, que é advogada trabalhista, afirma que a constituição estabelece a jornada de oito horas de trabalho por dia e 44 horas semanais, mas, em certos casos, são realizados acordos de compensação. É o caso de médicos, que costumam trabalhar em plantões mais longos, e trabalhadores do comércio, que em momentos como o final do ano, pegam jornadas mais extensas.

Quando processos por horas extras são abertos por empregados, pelo menos dois cenários são possíveis: no primeiro deles, se a empresa possui mais de 20 funcionários, cabe a ela provar que pagou ao funcionário da maneira correta, pois é obrigada, pela lei, a controlar os horários. Caso possua menos de 20 empregados, o funcionário que procurou a justiça deve provar o que lhe devem.

A juíza do trabalho Marília Sacramento, titular da 29° vara, na capital baiana, atua na área trabalhista há cerca de 30 anos. Ela explica que discussões sobre horas extras e todas as suas nuances são o “arroz com feijão” da justiça: “A justiça do trabalho nasceu por conta dos problemas relacionados à jornada, sempre julgamos e vamos julgar muito ainda”.

A juíza também deixa claro que dificilmente um processo envolve apenas horas extras e compara uma ação judicial com uma árvore de vários ramos, em que aparecem mais alegações, como danos morais, por exemplo.

“Às vezes o empregador pagou hora extra, mas não o suficiente de acordo com a categoria, então são várias situações”.

Marília ainda acredita que há uma “demanda reprimida” decorrente da pandemia, de pessoas que ficaram doentes ou outras que não querem que os processos sejam julgados virtualmente. Os trabalhos presenciais do tribunal voltaram no dia 7 de janeiro.

Desrespeito às leis trabalhistas no interior

Lisleno Kleber, 20 anos, morador da cidade de Uauá, na região nordeste do estado, conta que teve de processar o dono da farmácia onde trabalhou por um ano. Além de passar dos horários acordados em contrato, chegando a ficar cerca de 12 horas no local - o que também contraria a jornada de 44 hora semanais e 8 horas diárias da lei trabalhista, o patrão fazia descontos no seu salário caso alguma atitude do funcionário não fosse considerada adequada. “Uma vez, ele tirou 300 reais do meu salário porque me viu sentado mexendo no celular”, conta o rapaz.

Para piorar a situação, Lisleno recebia um valor menor do que o salário mínimo, além de nunca ter sido pago por fazer horas extras. “Eu estava esperando virar o ano para pedir demissão, mas ele falou para minha mãe que eu estava fora. Não chegou nem a falar comigo e nem dar aviso prévio”, relembra. Lisleno também ficou sem receber nenhuma rescisão.

Depois de cerca de um ano com o processo judicial, um acordo foi feito e Lisleno deveria receber R$ 8 mil, divididos em dez parcelas. Até agora, ele recebeu apenas a primeira delas. “O patrão queria pagar R$ 1.200 só, agora com a decisão, não tem mais jeito, vai ter que pagar tudo”, afirma o rapaz, que atualmente trabalha no setor de tributos da prefeitura da cidade em que nasceu.

Apesar do caso de Lisleno ter tido um desfecho positivo para o trabalhador, o advogado George Rocha, que atua nessa área em Salvador, lembra que depois da reforma trabalhista, feita em 2017, ficou mais difícil para o empregado processar o empregador por conta da jornada de trabalho.

Com a possibilidade da nova legislação em aumentar a flexibilização das relações entre patrão e empregado, a corda acabou arrebentando para o lado mais fraco e os funcionários enfrentam mais dificuldades, segundo o advogado. “As demandas caíram consideravelmente depois da reforma, ficou mais difícil para o funcionário e há um temor maior”, explica.

Um dos pontos alterados foi a dependência do funcionário em relação ao sindicato. Antes, se o patrão quisesse pagar as horas extras com dias de folga e não com dinheiro, por exemplo, era preciso que o sindicato aprovasse a medida. Agora o acordo passa a ser individual, o que deixa o empregado “à deriva”, ainda de acordo com o advogado. O “pagamento” de horas extras com folga pode ser feito em até seis meses.

Teletrabalho não gerou demanda extra na Justiça

Apesar de existir um senso comum de que pessoas atuando remotamente costumam trabalhar mais horas, pelo fato de estarem mais disponíveis por conta das tecnologias, a juíza Marília Sacramento afirma que uma alta da demanda não foi sentida pelo tribunal de Justiça do Trabalho.

“É um assunto muito novo, que ainda não bateu na justiça. Primeiro existe um fato, depois os problemas decorrentes do fato e só depois a judicialização”, explica a magistrada.

A advogada Ana Paula Studart pontua que o teletrabalho é caracterizado como uma exceção à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que não precisa ter um controle de jornada, apesar de ser possível. Graças às inovações tecnológicas, o “bater ponto” presencial agora pode ser feito através de grupos em aplicativos de mensagens e ferramentas específicas para isso.

A modalidade do trabalho remoto foi reconhecida pela Reforma Trabalhista em 2017 e possui lei própria que assegura garantias aos empregados e empregadores, assim como acontece nos regimes presenciais.

“É algo que está sendo muito discutido agora por conta da pandemia, porque muitas empresas começaram a adotar o teletrabalho, aumentando a quantidade de horas trabalhadas e aí nasce toda a discussão se deve ter controle de jornada ou não”, contextualiza.

Reclamação pode ser feita também sem advogado

Custear o serviço de um advogado, na maioria das vezes, não é barato. O cliente deve arcar com os chamados honorários advocatícios, termo usado para se referir à remuneração dos profissionais inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O advogado George Rocha explica que, na justiça do trabalho, é possível ingressar com uma reclamação sem auxílio de advogado. A prática se chama jus postulandi e, apesar de pouco comum, é legal e consiste nas situações em que o trabalhador vai diretamente ao judiciário em busca de seus direitos.

Apesar de ser um caminho possível, o advogado sugere que o funcionário busque ajuda nos casos que envolvem questões relativas à jornada de trabalho. “Procure o sindicato da categoria a qual pertence; seu advogado de confiança ou a Justiça do trabalho”, enumera

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