À beira do colapso: tempo de espera para regulação de paciente com covid é de 36 horas

À beira do colapso: tempo de espera para regulação de paciente com covid é de 36 horas

O alerta já foi dado: estamos à beira de um colapso no sistema de saúde. Tanto Salvador como a Bahia tiveram números recordes de demanda de pacientes que esperam por regulação na rede pública. Foram 500 pedidos de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e enfermaria exclusivos para o novo coronavírus no estado, sendo 384 para UTI. Em tempos normais, a média era de 80 pessoas, como informou a Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) à reportagem.

A capital baiana também teve o maior número já registrado até agora: foram 176 solicitações de regulação recebidas na manhã de hoje (3), 106 para leitos de covid-19 e 55 para UTI, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). O secretário de saúde, Leo Prates, escancarou que o tempo médio de espera para um paciente ser regulado na rede municipal é de 36 horas. A média, antes da crise sanitária, era de 4 horas.

A situação reflete a alta taxa de ocupação de leitos de UTI na Bahia e em Salvador. Até às 16h30 da tarde de hoje, estavam em 84% e 85%, respectivamente. Os dados vêm à tona um dia após o Brasil ter registrado o maior número de mortes nas últimas 24 horas desde o início da pandemia: foram 1.726 vidas perdidas, segundo o consórcio de veículos de imprensa.

“Estamos batendo recordes em cima de recordes de regulações. Ontem, regulamos 70 pacientes, e mesmo assim, o dia começou com 106 pessoas a serem reguladas. Nossa preocupação é que vínhamos de uma baixa ocupação, de 60, 65%, tínhamos leitos vagos, mas fomos preenchendo e hoje acredito que já passamos dos 90%, na prática”, relatou o secretário municipal de saúde, Leo Prates, em entrevista ao programa Bahia Meio Dia.

A tendência, nos próximos dias, é diminuírem as regulações, se não houver ampliação de vagas, segundo Prates, pela capacidade já estar no limite. “O sistema de saúde vai ficando estrangulado. Estamos tendo muito mais entradas do que saídas, por isso, está gerando esse acúmulo de pessoas nas UPAs [Unidades de Pronto Atendimento]. Estamos em cenário de guerra. Acredito que estamos na mais próxima do colapso, na penúltima”, alerta.

O secretário também pontua que os próximos dias provavelmente serão piores, se os índices continuarem no mesmo patamar. “O próximo passo é muito feio, é as UPAs não terem vagas. Já mandei colocar mais macas nas UPAs, para tentar aumentar a capacidade, mesmo que seja necessário colocar em outros espaços, e estamos vendo como colocar respirador de transporte. É trabalhar para o melhor cenário mas nos preparando para o pior, porque está bastante duro para o sistema de saúde”, conclui Prates.

Baianos perdem familiares por demora na regulação da UTI
Por conta da demora em conseguir um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o estudante de Ciências Econômicas, Rodrigo Sampaio, de 22 anos, perdeu a avó, Maria da Conceição - a mãe de sua madrasta. Ela residia na cidade de Santo Estevão, no Centro-Norte da Bahia, e tinha 78 anos. “Ela deu entrada na sexta-feira (26) e faleceu na última segunda (1). O hospital municipal da cidade não tinha estrutura para o quadro que desencadeou e ela morreu a esperar uma vaga de UTI nos hospitais de Feira de Santana. Minha família se movimentou em todos os hospitais privados da cidade, não conseguiu, e os hospitais públicos estão sem vaga”, conta Sampaio.

A família não desconfiou, no primeiro momento, que Maria da Conceição tivesse pego o vírus. “Ela já vinha demonstrando problemas de saúde, vinha sentindo dores de cabeça, mas não eram sintomas da covid, então por isso ninguém se atentou. Ela foi ao hospital municipal, não chegou a fazer o exame, e se sentiu melhor no dia seguinte. Só que depois piorou e não teve melhora, então ela voltou com falta de ar, fez o exame de sangue, que demonstrou covid, e o médico disse que desse quadro degenerou um AVC. Ela já chegou lá no hospital toda paralisada”, narra Rodrigo.

O estudante conta que a unidade não tinha respirador ou leito de UTI para atender a avô, por isso entrou na fila de espera em Feira de Santana, município mais próximo. “Os filhos dela rodaram Feira em busca de leitos de UTI, mas não conseguiram. Eu também comecei a procurar nos hospitais privados aqui de Salvador, mas a falta de leitos é total”, declara. O sentimento do neto postiço é de tristeza e impotência. “É um sentimento de perda e frustação por ter perdido um parente que gosto muito e isso me sensibilizou bastante, e frustação por não ter consigo nada, nenhuma resposta pronta de um hospital. É uma situação de desânimo total", desabafa.

No caso do pai do entregador de Rodolfo Augusto Oliveira, 34 anos, a transferência para um leito de UTI demorou pouco mais de 24 horas. Enquanto isso, ele ficou em um leito do gripário da UPA dos Barris. Mas só foi atendido da segunda vez que foi na unidade, no último domingo (28), quando voltou com sintomas mais graves. “Meu pai começou a sentir primeiro dor de garganta e uma tosse seca. Depois evolui para febre, lá para o quarto dia. Daí em diante, ele só estava na cama, só levantava para fazer necessidades básicas e se alimentar, estava se alimentando bem pouco. Depois que descobri a febre, levei para a UPA dos Barris, a gente ficou de 18h às 22h30, e disseram que ele não teria prioridade, por conta da pandemia”, diz o filho de Carlos Augusto.

Rodolfo decidiu então, no dia seguinte, que iria ao centro médico de Pernambués. Só que o médico de lá informou a ele que só atenderia se a saturação de oxigênio e a temperatura estivessem anormais. Por isso, voltaram à UPA dos Barris, onde foram atendidos com mais rapidez, pela saturação de oxigênio estar em 95%. De lá, Carlos recebeu a transferência para o Hospital Municipal. “Na hora dele entrar e ficar internado no gripário, minha tristeza foi que nem consegui apertar a mão dele. Depois a médica deixou eu falar por dois minutos, foi o tempo que tive”, lamenta. O quadro do pai apresentou melhora, ele saiu da UTI e foi para um leito de enfermaria, mas continua precisando de oxigênio.

Demora também acontece na rede privada
A demora na transferência para um leito de UTI também ocorreu com a mãe da cozinheira Michele Figueiredo, 39 anos, moradora de Camaçari, Região Metropolitana de Salvador (RMS). Márcia Maria é diabética, tem 60 anos, e sofreu infarto dentro de casa. Ela estava na casa de uma das filhas, a irmã de Michele, em Salvador. Mesmo com plano de saúde, foram quatro dias sem leito de UTI. No meio tempo, ela ficou internada na ala vermelha no hospital Santa Izabel.

“Minha mãe deu entrada no Santa Izabel com falta de ar e ela infartou dentro de casa. A gente ficou sem UTI por quatro dias, depois surgiu uma vaga e colocaram na UTI. Ela só consegue respirar de costas, de bruços, e não deixam visitar para saber como ela está e a gente não tem acesso aos exames nem relatório, só falam comigo pelo telefone uma vez por dia”, conta Michele. Por conta disso, a filha acredita que Márcia tenha pego covid-19 no hospital. Segundo o boletim médico, a mãe está com 70% dos pulmões comprometidos e pneumonia. Ela já está na Unidade de Terapia Intensiva há uma semana. “Estou rezando todo dia para se dá uma melhorada, mas a gente nunca imaginava que ela estava com covid”, completa. Ela testou negativo para a doença, mas a irmã contraiu o vírus e está em isolamento.

A diretora médica do Hospital Aeroporto e responsável técnica Eliane Noya comenta que o ideal é não haver lentidão no atendimento de pessoas em estado grave. “Qualquer demora no atendimento de um paciente que esteja em estado grave pode trazer consequência do quadro se tornar mais grave e, em último caso, ocorrer a óbito. Realmente é uma coisa que não se espera e não se deseja demora na regulação. O correto é que ele vá imediatamente pra UTI quando houver indicação”, explica Eliane.

A diretora médica revela que há duas semanas que a unidade onde coordena está com 100% de ocupação de leitos de UTI para covid-19. Todos os 20 disponíveis estão ocupados e não houve transferência de paciente da emergência para a UTI nas últimas 24 horas, por falta de vaga. Algumas medidas foram tomadas para evitar o colapso - há um mês eles não aceitam transferências de outros hospitais e uma ala semi-intensiva foi aberta, com 10 leitos, para dar suporte à UTI.

Além disso, por conta da baixa rotatividade dos leitos, o Hospital Aeroporto solicita transferência de leito de UTI para o Sistema Único de Saúde (SUS) e para o plano de saúde, para outro hospital privado. Ultimamente, não há vagas em nenhuma das duas redes. “Normalmente a gente não coloca na regulação do SUS porque a regulação do plano acabava conseguindo uma vaga rápido. Mas agora não. Então o que surgir primeiro, ele é logo transferido”, complementa.

Só não se recusa pacientes em que haja baixa oxigenação no sangue. “Quando se tem uma baixa da oxigenação, que a gente precisa usar o oxigênio suplementar, isso indica que ele precisa ficar no hospital, porque em casa não existe esse suporte. Então a prioridade para ser internado na unidade hospitalar é o paciente que mais precisa do que se tem no hospital”, esclarece Noya. A média de permanência nos leitos também aumentou. Antes, o paciente passava 5 a 7 dias na UTI. Agora, a média é no mínimo 10. A predominância de internamentos, segundo ela, é do sexo masculino (60%) e acima de 60 anos (70%).

Além dos 2.254 leitos que existem na Bahia, o governo estadual abrirá mais de 600 leitos, sendo cerca de 400 clínicos e os demais de UTI. Segundo a Sesab, eles serão distribuídos entre capital, região metropolitana, sul e extremo sul da Bahia. Em Salvador, são 1.059 leitos ativos.

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  • Empresa brasileira vira concorrente da BYD pela antiga fábrica da Ford em Camaçari

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    O documento da SDE, ainda segundo a Folha, diz que a BYD havia apontado interesse no complexo industrial de Camaçari, mas outros interessados também poderiam "manifestar interesse em relação ao imóvel indicado e/ou apresentar impedimentos legais à sua disponibilização, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir desta publicação".

    A montadora chinesa anunciou em julho passado, em cerimônia com o governador Jerônimo Rodrigues no Farol da Barra, um investimento de R$ 3 bilhões para construir no antigo complexo da Ford três plantas com capacidade de produção de até 300 mil carros por ano.

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    Procurada pelo CORREIO, a BYD afirmou que não vai se pronunciar sobre o assunto, e que o cronograma anunciado está mantido.

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    Entre as perguntas não respondidas pela pasta na nota estão o prazo para a conclusão da definição sobre a área e o impacto que a concorrência entre BYD e Lecar traz para a implantação de uma nova fábrica de veículos no estado.

  • Bahia adere ao Dia D de mobilização nacional contra a Dengue

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    A Bahia registra um aumento significativo de casos de Dengue, com 16.771 casos prováveis até 24 de fevereiro de 2024, quase o dobro em comparação ao mesmo período do ano anterior. Atualmente, 64 cidades estão em estado de epidemia, com a região Sudoeste sendo a mais afetada. Além disso, foram confirmados cinco óbitos decorrentes da doença nas localidades de Ibiassucê, Jacaraci, Piripá e Irecê.

    De acordo com a ministra da Saúde, Nísia Trindade, o cenário nacional é particularmente desafiador devido ao impacto das condições climáticas adversas e ao aumento exponencial dos casos de Dengue, incluindo a circulação de novos sorotipos (2 e 3), que exigem uma atenção mais integrada.

    Na avaliação da secretária da Saúde do Estado, Roberta Santana, o momento é de unir esforços para conter o aumento do número de casos e evitar mortes. "O Governo do Estado está aberto ao diálogo e pronto para apoiar todos os municípios, contudo, cada ente tem que fazer a sua parte. As prefeituras precisam intensificar as ações de atenção primária e limpeza urbana, a fim de eliminar os criadouros, e fortalecer a mobilização da sociedade, antes de recorrer ao fumacê. A dependência excessiva do fumacê, como último recurso, pode revelar uma gestão reativa em vez de proativa no combate à doença", afirma a secretária.

    A titular da pasta estadual da Saúde pontua ainda que o Governo do Estado fez a aquisição de novos veículos de fumacê e distribuirá 12 mil kits para os agentes de combate às endemias, além de apoiar os mutirões de limpeza urbana com o auxílio das forças de segurança e emergência. "Além disso, o Governo do Estado compartilhou com os municípios a possibilidade de adquirir bombas costais, medicamentos e insumos por meio de atas de registro de preço", ressalta Roberta Santana.

    Drones

    O combate à Dengue na Bahia ganhou mais uma aliada: a tecnologia. O Governo do Estado deu início ao uso de drones como nova estratégia para identificar em áreas de difícil acesso focos do mosquito Aedes aegypti, vetor de transmissão de Dengue, Zika e Chikungunya. As imagens capturadas pelos equipamentos são analisadas pelos agentes de endemias, que conseguem identificar locais com acúmulo de água parada e possíveis criadouros do mosquito, facilitando a ação das equipes e tornando o combate mais eficaz.

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